SENAI CETIQT: uma análise sobre as ações realizadas na “Semana Fashion Revolution 2024” em prol da moda responsável


A Faculdade SENAI CETIQT – instituição parceira do movimento global Fashion Revolution -, que atua de forma transversal em temas identificados como portas para o futuro para as cadeias dos segmentos químico e têxtil e é ponte entre o conhecimento acadêmico + referência na formação de profissionais altamente qualificados para a indústria, realizou uma série de atividades durante a Semana Fashion Revolution 2024, seguindo a temática “Como Revolucionar a Moda”, que norteia as ações do movimento para este ano. No prédio high tech da sede da Faculdade SENAI CETIQT e do Instituto SENAI de Tecnologia Têxtil e de Confecção (IST), na Barra da Tijuca, onde também está instalado o Fashion Design Hub, a programação foi totalmente voltada para estimular a conscientização de fabricantes de roupas, consumidores e alunos sobre a necessidade de promover uma moda consciente e sustentável

Se quisermos continuar a habitar esse planeta são necessárias práticas sustentáveis e atreladas aos processos da natureza. Caso contrário, não haverá saída. Não há um segundo Planeta Terra. Relatório das Nações Unidas estima que chegaremos a 9,7 bilhões em 2050. E as sirenes vermelhas sobre as mudanças climáticas nunca foram tão reverberadas. Os alertas sobre a necessidade de manter o aquecimento global abaixo de 1,5 grau Celsius vêm se multiplicando e se intensificando a cada minuto: a situação em que nos encontramos é alarmante. Hoje, as palavras-chave são sustentabilidade, responsabilidade e transparência em um mundo no qual os recursos naturais tendem a ser cada vez mais escassos. A Faculdade SENAI CETIQT – instituição parceira do movimento global Fashion Revolution -, que atua de forma transversal em temas identificados como portas para o futuro para as cadeias dos segmentos químico e têxtil e é ponte entre o conhecimento acadêmico + referência na formação de profissionais altamente qualificados para a indústria, realizou uma série de atividades durante a Semana Fashion Revolution 2024, seguindo a temática “Como Revolucionar a Moda”, que norteia as ações do movimento para este ano.

Atividades da “Semana Fashion Revolution 2024” na Faculdade SENAI CETIQT (Foto: Divulgação)

O movimento global teve início em memória das vítimas do desabamento do edifício Rana Plaza, em Bangladesh. Em 24 de abril de 2013, morreram 1.134 pessoas, sendo a maioria trabalhadores de confecções que forneciam para grandes marcas do varejo mundial. A partir de então, a hashtag #QuemFezMinhasRoupas é usada tanto com a intenção de trazer visibilidade aos trabalhadores da cadeia produtiva da moda como a consciência do consumidor ao comprar um produto e saber com total transparência como foi produzido.

A indústria da moda é a segunda mais poluidora do mundo, atrás apenas da indústria petrolífera. Levantamento publicado pela Global Fashion Agenda, organização sem fins lucrativos, aponta que mais de 92 milhões de toneladas de resíduos têxteis foram descartados em anos recentes. E a projeção é de um aumento de 60%, ou mais de 140 milhões de toneladas nos próximos oito anos. Segundo o relatório Fashion on Climate, do Global Fashion Agenda com a McKinsey and Company, as empresas que confeccionam roupas e acessórios emitiram, em 2018, cerca de 2,1 bilhões de toneladas de gases de efeito estufa. Esse montante equivale a 4% das emissões globais. Cerca de um caminhão de lixo é enviado para aterros sanitários a cada segundo no mundo. Só no Brasil, são descartados 4 milhões de toneladas de resíduos têxteis por ano. Desse total, 80% são destinados a lixões e aterros sanitários. E os impactos socioambientais gerados pela indústria da moda vão da poluição ambiental à utilização excessiva de recursos. É preciso mudar agora, passando pela valorização dos trabalhadores de todos os elos da cadeia, por um produto de moda pensado desde a fase de projeto para redução de desperdício e para maior durabilidade. É importante ainda lembrar que cada um de nós também precisa refletir, participar e assumir seu papel de protagonismo do consumo consciente.

O pensar e alinhavar processos criativos utilizando resíduos (Foto: Divulgação)

A Faculdade SENAI CETIQT está totalmente em sinergia com a tônica do movimento Fashion Revolution, que trabalha para que a moda conserve e restaure o meio ambiente, valorizando as pessoas acima do crescimento e do lucro. O movimento existe para que a moda seja limpa, segura, justa, transparente, diversa e responsável para todos, atuando por meio da comunicação, educação, colaboração, mobilização e participação. Portanto a instituição levou para a roda a ampliação do debate em relação à origem e ao destino de peças fabricadas por marcas do ramo da moda e a proposta foi transformar as palavras em ação com uma série de oficinas. No prédio high tech da sede da Faculdade SENAI CETIQT e do Instituto SENAI de Tecnologia Têxtil e de Confecção (IST), na Barra da Tijuca, onde também está instalado o Fashion Design Hub, a programação foi totalmente voltada para estimular a conscientização de fabricantes de roupas, consumidores e alunos sobre a necessidade de promover uma moda consciente e sustentável.

As rodas de conversa lotadas durante a “Semana Fashion Revolution 2024”, no SENAI CETIQT

A programação, entre os dias 15 e 17, contou com oficinas focadas na reutilização de tecidos, materiais eletrônicos e de confecção de macramê, além de rodas de conversa com convidados atuantes nas áreas de upcycling e economia circular na moda. Entre os convidados da primeira roda de conversa,  com o tema “Dos Resíduos à Criação – Cenário e Figurino”, Almir França, estilista e mestre em História da Moda, mostrou sua expertise sobre a moda de reuso, que é o foco do seu trabalho. O estilista também disponibilizou peças de reutilização criativa, confeccionadas por ele, a partir de uniformes profissionais dos trabalhadores da empresa de energia elétrica, ENEL. A Semana Fashion Revolution 2024 contou ainda com oficina de upcycling com Larissa Castilho; outra oficina batizada “Dos Resíduos ao Figurino – forma e expressão” com Lorena Sender. No segundo dia do evento, acompanhamos, a Roda de Conversa ”A importância dos Resíduos” com Roberto Bentes e Camila Costa, no Fashion Design Hub do SENAI CETIQT, e as oficinas de Macramê, com Elton Rosa; e “Ressignificando resíduos eletrônicos em Acessórios e Adornos”, com Karol Mussury. Em seguida, mergulhamos nas palestras sobre “Tecidos Sustentáveis”, com Ana Carolina Poye, e “Resíduos Criativos”, com Gabriela Mazepa, ambas do Grupo SOMA.

Oficina de macramê na Faculdade SENAI CETIQT (Foto: Divulgação)

Oficina de acessórios na Faculdade SENAI CETIQT (Foto: Divulgação)

Com o intuito de envolver a comunidade acadêmica em torno da causa, os alunos de Design de Moda do SENAI CETIQT vão produzir, no dia 24, quarta-feira, um bazar gratuito, para a troca de roupas e acessórios, e um desfile com roupas desenvolvidas a partir da técnica de upcycling, que pode ser definido como “redesign inteligente” (upcycling = design + sustentabilidade). Podemos agregar detalhes, referências de moda, de tendências no produto. É uma espécie de “Faça você mesmo”. Mas, basicamente, é uma prática com objetivo sustentável, de dar nova vida àquele material de forma que não seja necessário utilizar mais recursos e gerar novos impactos.

Alunas de Design de Moda do SENAI CETIQT em ação durante a “Semana Fashion Revolution 2024” (Foto: Divulgação)

OBRAS DE ARTE EM FORMA DE ROUPA ATRAVÉS DO UPCYCLING

No mês passado, acompanhei o desfile de Almir França, que marcou sua chancela ao assinar o belíssimo “Energia by Almir França“ 100% realizado a partir de técnicas de upcycling. No Museu de Arte Contemporânea, em Niterói, durante o ID: Rio Festival, foram apresentados 50 looks produzidos, desde tecidos até acessórios, todos feitos com materiais reutilizados dos uniformes dos trabalhadores da Enel. Uma coleção de moda casual é criada anualmente como forma de resultado de mais de 10 toneladas de roupas usadas e resíduos.

FESTIVAL ID:RIO - Obras de arte em forma de roupa, a coleção 'Energia by Almir França' foi feita com upcycling de uniformes

‘Energia by Almir França’ (Foto: Thais Mesquita)

“Energia by Almir França” (Foto: Thais Mesquita)

Ele pontou; “Nesses últimos 20 anos de projeto, fui entendendo reaproveitamento como matéria-prima importantíssima para qualidade de texturas e novas possibilidades de criação. O grande ponto positivo do nosso projeto é ter o reuso como metodologia de ensino da moda. Hoje temos muitos parceiros, empresas e instituições de ensino que nos apoiam com a ideia de se empreender com os resíduos”.

“Energia by Almir França”

“Energia by Almir França”

 

FASHION REVOLUTION: UMA DÉCADA DO PROJETO DE MODA CONSCIENTE

Encontrei a diretora do Instituto Fashion Revolution Brasil, Fernanda Simon, na edição passada do Minas Trend, Salão de Negócios realizado em Belo Horizonte (MG), quando ela foi convidada para uma palestra. Pouco tempo antes, também acompanhei uma live promovida pelo SENAI CETIQT na qual ela participou direto do Acre, onde estava conhecendo o projeto ‘Faça Florescer Floresta’. Ela foi enfática: “O momento é desesperador. Então, precisamos que todos os setores tenham ações imediatas, inclusive o da moda. Afinal, todo mundo usa roupas. Nós acreditamos em sustentabilidade como jornada, como um processo constante de evolução”. E acrescentou: “Transparência é só um caminho para a sustentabilidade. Nós acreditamos em sustentabilidade como jornada, como um processo constante de evolução. Não tem como falarmos disso se não sabemos o que está acontecendo. E, para sabermos o que está acontecendo, precisamos de transparência”.

Durante oficina, o ressignificar peças com técnicas criativas e maior valor agregado (Foto: Divulgação)

Na ocasião, frisei aqui no site que, para que a relação entre moda e natureza seja cada vez mais equilibrada, com benefícios para todos sem agressões ao meio ambiente, o Fashion Revolution criou o Índice de Transparência, um dos carros-chefes do movimento. “As marcas têm grande potencial de impacto, tanto negativo como positivo. É essencial dialogarmos com elas, incentivarmos as melhores práticas, cobrarmos responsabilidade. Elas precisam ser exemplos, ter mais agilidade, tornar-se referência no setor graças a seu tamanho e a sua potência. Se as grandes marcas começam a trazer práticas positivas, quantas outras poderão se inspirar nelas elas e quantas pessoas não serão impactadas por fazerem parte dessas cadeias?”, analisou Fernanda.

Essa avaliação é feita através de diversos questionários com vários pontos. Durante esse processo, o Fashion Revolution promove encontros com as marcas e oferece workshops. As reações são bastante distintas: marcas fazendo uma excelente adequação de processos positivos e ainda outras que não interagem e acabam não tendo participação alguma na avaliação. O pessoal do FR, porém, acredita que, conforme o desenvolvimento do projeto aconteça, haverá cada vez mais engajamento, impactando o setor como um todo.

“Desde a criação do movimento, foi visível o avanço da conversa sobre a qualidade do trabalho das pessoas que fazem nossas roupas. Surgiram iniciativas, políticas públicas e engajamento de marcas trazendo melhorias em seus processos internos, porém ainda assim essas mudanças não foram capazes de garantir trabalho digno e salário decente para os trabalhadores”, disse Fernanda Simon.

Ressalta que no Brasil, segundo dados sistematizados pelo Departamento Intersindical de Estatística e Estudos Socioeconômicos (DIEESE), tendo como referência a PNAD Contínua, mais de 70% são mulheres. São propulsoras do fazer a roda da economia girar e o protagonismo da economia criativa no setor moda, capaz de nos proporcionar encantamento em cada uma das peças criadas por pessoas com histórias de vida que emocionam, são transformadoras, oxigenam o mercado com suas identidades, incentivando uma nova geração de valores.

O poder da forma da mão de obra feminina na moda brasileira (Foto: Divulgação)

A diretora do Fashion Revolution Brasil acredita que a indústria e o varejo de moda nacionais ainda dialogam pouco com o instituto: “Precisam interagir mais. Temos um canal de comunicação e encontros, seminários, disparo de materiais de comunicação e material de incentivo ao engajamento mostrando alguns caminhos para as marcas responderem ‘Quem fez as minhas roupas?’. A mudança precisa ser sistêmica. Não é colocar toda a responsabilidade no consumidor. O setor privado precisa ser mais responsável, transparente e ético. E o setor público idem”.

Reproduzo aqui uma frase importantíssima: “É imprescindível reforçar que o caminho para a sustentabilidade é complexo, longo e precisa de uma abordagem sistêmica, logo, o interesse das marcas na pauta deve ser entendido apenas como o início de um longo caminhar, que, se não for sério e de fato responsável, pode acabar sendo um desserviço, se apresentando como greenwashing e atrapalhando o desenvolvimento do setor como um todo”.

A criatividade em prol da moda autoral na “Semana Fashion Revolution 2024” (Foto: Divulgação)

O segmento autoral da moda vem crescendo a cada ano. Nele, agregam-se alguns conceitos do tripé da sustentabilidade – econômico, social e ambiental -, reciclagem, cadeia produtiva ética e limpa, utilização de produtos e mão de obra local, valorização da economia criativa e respeito aos direitos humanos. E, assim, pudemos lançar um olhar 360 graus para as mudanças de mindset e o reverberar de vozes repletas de identidade sobre os saberes ancestrais e regionais, economia circular, zero waste, sustentabilidade + consumo consciente, responsabilidade socioambiental, upcycling, ressignificando uma nova produção na moda nacional.

A autoralidade nas oficinas realizadas na Faculdade SENAI CETIQT (Foto: Divulgação)