Jean Wyllys prestigia o documentário “Entre os Homens de Bem”, do qual é protagonista, no Festival do Rio: “Sou gay e corro o risco de morrer por isso”


“Sou deputado por uma causa, não pelo salário – até porque, na iniciativa privada ganhava mais. Não é pela visibilidade, porque isso eu já tinha e era menos ofendido e ameaçado de morte. Defendo a democracia, a laicidade do estado, os direitos humanos. Essa luta deveria ser de todos”, disse Jean Wyllys em entrevista exclusiva depois da exibição do documentário. Vem ler a entrevista completa!

*Por Bia Amorim e Patrick Monteiro

Jean Wyllys é apontado como um corpo estranho em um Congresso Nacional de tendências cada vez mais conservadoras. Esse foi o fio condutor de “Entre os Homens de Bem”, de Caio Cavenchini e Carlos Juliano Barros, documentário apresentado no Festival do Rio na noite de domingo, 9. O deputado federal (PSOL-RJ), claro, esteve presente no Roxy, em Copacabana, para prestigiar o trabalho da equipe, que durante três anos acompanhou seus passos como porta-voz da causa LGBT. “É doloroso ver o filme, porque tenho que reviver uma série de situações que não são agradáveis. As ofensas dizendo que sou escória, um lixo, que devo morrer. O documentário ressalta bem a construção do inimigo público, de como ela se dá”, comentou Jean.

Jean Wyllys entre os diretores

Jean Wyllys entre os diretores Caio Cavenchini e Carlos Juliano Barros

Duro, o documentário mostra a chegada de Jean à Câmara Federal e todas as investidas articuladas para a sua desmoralização. Também revela as constantes agressões que o parlamentar enfrenta não apenas por seus companheiros fundamentalistas de plenário, como também por populares que chegam a ameaçá-lo de morte por ser gay. A plateia reagiu durante a sessão: ora rindo dos xingamentos absurdos proferidos por seus pares políticos que beiravam à implicância infantil; ora se emocionando com a saga desse professor universitário, nordestino e vencedor da quinta edição do reality show “Big Brother Brasil”. “O fenômeno que aconteceu comigo no BBB foi sui generis. Não tinha a ver com o programa, tinha a ver comigo”, apontou o parlamentar, durante a entrevista feita após a exibição do documentário, que concorre ao Prêmio Félix na categoria Première Brasil.

HT – Qual a sua visão sobre a abordagem do filme?
JW – É a história de como o fundamentalismo emerge a partir da minha chegada ao Congresso. Quando fui eleito no primeiro mandato houve uma reação da parte mais conservadora da casa e isso é acompanhado pelos diretores. Acho doloroso rever as ofensas que dirigem a mim. O filme é um documento histórico, que ressalta bem a construção do inimigo público. É o recurso usado pelas igrejas evangélicas neopentecostais fundamentalistas, não todas as igrejas, que tomam o dinheiro dos fiéis para espalhar boatos e difamações ao meu respeito.

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FR – Muitas das difamações vitimizam você e a causa LGBT…
JW – Ao longo da história todas as minorias que se insurgiram foram acusadas de se vitimizar. Essa acusação é muito comum dos opressores em relação aos oprimidos. Não por acaso, tem um dos fascistas do filme que diz que a melhor solução para sanar o racismo é não falar sobre ele. Pode?

FR – Outra questão apontada em “Entre os Homens de Bem” é o fato de você ser um lobo solitário em meio aos deputados. É assim mesmo?
JW – Na Câmara tenho uma rede de 120 deputados aliados. Nenhum deles é homossexual, não vivem os dramas e os preconceitos. Sou gay e corro o risco de morrer por isso. Dificilmente um deputado simpatizante vai entender essa questão a fundo. Tem alguns que se distanciam da luta durante a campanha para não perder votos.

FR – O filme mostra que você diverge em alguns pontos das lideranças do movimento LGBTQI. Que pontos são esses?
JW – Acho que a criminalização da homofobia tem que ser nos seguintes termos: a violência dura, assassinato, lesão corporal, tortura. Isso deve ser punido com prisão, como prevê o código penal. Defendo que esse delito seja agravado pela motivação de ódio. Não acho que xingamento e insulto devam levar alguém para prisão; uma vez que há gente que xinga porque foi criado com outra mentalidade. O direito penal vai se voltar contra os mais pobres, como sempre. Não quero que as pessoas gostem de mim, quero que elas respeitem meus direitos.

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FR – Você é o único deputado abertamente homossexual atualmente no Congresso. Pretende continuar a disputar outros mandatos?
JW – Sou deputado por uma causa, não pelo salário – até porque, na iniciativa privada ganhava mais. Não é pela visibilidade, porque isso eu já tinha e era menos ofendido e ameaçado de morte. Defendo a democracia, a laicidade do estado, os direitos humanos. Essa luta deveria ser de todos. E, mesmo sabendo que existem muitos homossexuais que não gostam de mim, luto pelos direitos deles, porque não estou nisso para que as pessoas gostem de mim. Talvez eu não venha candidato nas próximas eleições. Não é algo que dependa só de mim, tenho responsabilidade com o povo, com o partido e com os que represento. Contudo, o que nunca vou deixar de fazer é política, seja na literatura, na sala de aula, na televisão.