“Cinquenta tons de cinza”: nem a escala Pantone salva esse soft pornô feito para levar mulherzinha ao cinema!


Melhor seria ficar em casa e abastecer a geladeira com pão de queijo e cervejinha para assistir àquelas clássicas comédias de comportamento no Canal Brasil. Até a trilha é mais divertida!

Autor de obras nas quais lidava despudoradamente com sexo, prazer, libertinagem e perversão, Donatien Alphonse François de Sade – o Marquês de Sade (1740-1841) – deve estar dando gargalhadas em seu esquife ao conferir o quanto a humanidade pouco evoluiu nesses últimos 200 anos no campo da sexualidade, apesar do seu legado – que serviu como base para vários estudos da psicanálise e influenciou cineastas como Luiz Buñuel e Pier Paolo Pasolini. Ao assistir a “Cinquenta Tons de Cinza” (“Fifty Shades of Grey”, de Sam Taylor-Johnson, 2015), a versão para as telas do best seller erótico escrito pela inglesa E. L. James, o nobre libertino possivelmente acharia mais divertido jogar biriba com um grupo de velhinhas em Miami, se enojando das alcovas apresentadas nesse sado-masô de butique, embalado por ternos Armani, lingeries da Victoria’s Secret e quartos secretos pessimamente decorados por set designers de gosto duvidoso, do tipo que assiste a programas de extreme makeover nos canais de TV a cabo, e acreditam piamente que paredes forradas com capitonê vermelho e uma coleção de chicotes (que mais parecem espanadores de ricos cafonas feitos com plumas de pavão) seriam suficientes para despertar a libido de casais com cara de vampiro em filme para adolescente.

A produção é o primeiro capítulo de uma trilogia que começou a  chegar nas livrarias em 2011 e não é muito diferente de “Crepúsculo” (“Twilight”, de Catherine Hardwicke, Summit Entertainment e outros, 2008), a saga fantástica que reduz seres mitológicos como vampiros e lobisomens a delicados nerds românticos e barbies descamisadas. Assim como esse, o pueril romance entre a inicialmente ingênua Anastasia Steele e o bilionário sodomita Christian Grey não passa de uma versão adocicada vazia, perfeita para papar milhões – tanto nas livrarias quanto nos cinemas – às custas dos novos tempos, repletos de incautos que acreditam com veemência que o mundo se resume à falta de profundidade e que o trabalho de diretores de arte, light designers e figurinistas supre a ausência de estofo numa existência (e num espetáculo) de plástico.

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Fotos: Divulgação

Cada geração tem o soft pornô que merece, independente dos programas exibidos na madrugada do Multishow (ou nas sextas sexies da Band nos anos 1980), e “Cinquenta tons de cinza” não é muito diferente de “Nove semanas e meia” (Nine 1/2 Weeks, de Adrian Line, MGM, 1986) o equivalente yuppie que catapultou ao estrelato absoluto Kim Basinger e Mickey Rourke. Algumas cenas são idênticas – como o clichê do gelo no umbigo –, assim como o guarda-roupa, a coleção de gravatas para a prática do bondage e o closet do mocinho, com a diferença que, neste, o público podia conferir… Kim Basinger e Mickey Rourke!

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A modelo vertida em atriz Dakota Johnson é a prova cabal de que até uma ruiva –  geralmente a síntese da figura indômita com seus cabelos cor de fogo, vide Rita HayworthIsabelle HuppertJulianne Moore e até Jessica Rabbit –  pode se tornar tão insípida quanto uma lata de pêssegos em calda com creme de leite, e que Wando perdoe essa apropriação. Felizmente, o elenco feminino conta com a sempre ótima Marcia Gay Harden fazendo uma ponta em duas cenas. Ela devia mesmo estar precisando amealhar uns trocados para topar participar dessa produção e quem lucra é o público.

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E, na ausência de um genuíno macho alfa dominante, tão fora de moda nos tempos atuais, Jamie Dornan se encarrega de dar a vida (ou a falta dela!) a Christian Grey com seu biotipo de twink sequinho, sarado no ponto certo, abdômen tanquinho, branco feito cera de vela e penteado de metrossexual, daqueles que nem o fio de cabelo 18.712 sai do lugar na hora de chegar aos finalmentes. Não é muito diferente de um modelo da Gucci na passarela ou dos candidatos a desfile da Dior Homme que se apresentavam nos castings da grife na época de Hedi Slimane. O terno cai que é uma beleza, a calça jeans revelando o elástico da cueca funciona perfeitamente em uma propaganda da Calvin Klein e é só.

Arte imita a vida: Dornan posa para uam campanha da Calvin Klein que sintetiza sua presença no filme. Enquanto ator, o bonitão é uma ótima propaganda de cuecas (Foto: Reprodução)

Arte imita a vida: Dornan posa para uma campanha da Calvin Klein que sintetiza sua presença no filme. Enquanto ator, o bonitão é mesmo uma ótima propaganda de cuecas (Foto: Reprodução)

Mas, como estamos falando de bilheterias dos novo milênio e o gênero super-herói é o mais lucrativo da indústria atualmente, que o espectador não se iluda: Christian Grey é uma espécie de super paladino do sexo. Além de comandar empreendimentos caríssimos, ele tem um time de Bond Girls treinadíssimas em seu escritório, toca piano, dirige helicóptero, é um às supremo no volante de um sem-número de baratinhas velozes e furiosas, praticamente se teleporta de Seattle para a Georgia atrás de seu objeto sexual, estampa sua carinha ilustre nas colunas sociais dos jornais e ainda encontra tempo para seduzir. Uma espécie de X-Man, mas nunca X-rated.

Trailer oficial (Divulgação)