A Última Sessão: peça com elenco poderoso da terceira idade chega ao Rio de Janeiro renovada e traz importantes discussões


Daisy Lucidi, Suely Franco, Suzana Faini, Antônio Pitanga, Odilon Wagner, Miriam Mehler, Tânia Bondezan, Rubens de Araújo e Regina Sampaio dão um show provando que idade não é problema na peça A Última Sessão

As cortinas se abrem para mostrar um elenco incomum, pois alguns dos nove atores não subiam aos palcos há mais de 30 anos. O motivo não foi pessoal, se tratava apenas de falta de oportunidades. Neste momento de suas vidas, a data de nascimento na carteira de identidade começou a pesar, cada vez mais, na escolha dos diretores no momento da seleção, razão que os fez ficarem de lado da cena. No entanto, quando um profissional é bom, o talento nunca o deixa mesmo que ele tenha 88 anos, como Daisy Lucidi. Ao seu lado, Suely Franco, Suzana Faini, Antônio Pitanga, Odilon Wagner, Miriam Mehler, Tânia Bondezan, Rubens de Araújo e Regina Sampaio dão um show provando que idade não é documento na peça A Última Sessão. Depois de um ano de sucesso em São Paulo, o espetáculo que valoriza a classe da terceira idade chega ao Rio de Janeiro com um elenco, praticamente, novo. “Esta peça é uma forma de quebrar barreiras porque nós somos atores, não importa a idade. Não existe oportunidade para esta faixa etária no mercado, é muito raro. Os autores têm dificuldade de enxergar os mais velhos e valorizar o amadurecimento. É difícil ver uma dramaturgia feita para atores, sem importar a sua idade. Além deste desafio, a galera da terceira idade também tem dificuldade de se ver como mais velho”, comemora Antônio que faz um maître que se apaixona por uma das personagens, trazendo um romance mesmo na maturidade, algo pouco mostrado segundo o ator.

Atores e amigos vieram recepcionar o elenco ontem na estreia para convidados (Foto: AgNews)

A trama se passa em um restaurante no qual semanalmente um grupo de terapia se reúne. No entanto, esta será a última sessão o que significa uma despedida do conjunto. Para celebrar os oito anos juntos, eles resolvem criar uma cena na qual cada um deve expor seus sentimentos e desejos mais profundos de forma muito exagerada. “É uma sessão de terapia, então, a personagem que faço no começo foi criada pelo grupo de terapia, especialmente pela Maria Teresa, para poder me libertar da culpa terrível que sinto, porque a história verídica é que ela teve um caso com o mesmo homem por 35 anos”, exemplifica Miriam Mehler cujo papel só se abre a outras possibilidades de vida depois que encontra o amor. A atriz foi a única que participou da peça em São Paulo e continuou no elenco carioca. “Os atores são diferentes, a energia é outra, mas está sendo igualmente prazeroso”, garante.

Inicialmente, o público não sabe que aquela conversa não passa de um fingimento e, muito menos, que cada personagem faz parte de um clube de terapia. “Entramos em cena sem mostrar, inicialmente, do que se trata aquela reunião. Isso é um pouco difícil de fazer, então, parti do princípio que estava em um almoço em grupo”, conta Suzana Faini que interpreta uma mulher muito ressentida e amargurada. Durante todo o primeiro ato da peça, desabafos, escândalos e desavenças vão acontecendo até o momento culminante em que, uma das pessoas, é morta de mentira o que acaba chocando os espectadores que acreditam naquela inverdade. “A virada de jogo, em uma dramaturgia, é sempre muito marcante e bem-vinda”, garante Odilon Wagner.

A estreia para convidados aconteceu ontem em Copacabana, com direito a presença ilustre de Maitê Proença (Foto: AgNews)

Cada personagem expõe em cena suas intimidades. “Esta peça traz a mensagem de que é necessário ter coragem de expor todos os problemas e as angústias. Isto estimula as pessoas a viver”, sugere a atriz Regina Sampaio. Suely Franco, por exemplo, vive uma senhora que gostaria de ser mais ousada sexualmente. Daisy Lucidi é a parte cômica da peça, faz uma mulher que não gosta de falar palavrão e não consegue aceitar que seu filho é homossexual. Tania Bondezan interpreta uma atriz muito amargurada que focou na carreira e escolheu deixar a vida amorosa de lado. “Nós vivemos amargurados seja pelo papel que não conseguimos ou pela oportunidade de emprego que não aconteceu. Perdemos o nosso tempo sentindo esta angústia. Apesar da Amanda ter sucesso como atriz, ela negou uma parte da sua vida, a sua felicidade”, complementa Tania que, apesar de ser 20 anos mais nova, já sente a retaliação.

O diretor e autor da peça está em cena e é o próprio Odilon Wagner. Na peça, vive um senhor cujo sentimento amoroso foi abafado e escondido durante toda a vida por causa de uma de série de desencontros. “A trajetória de cada personagem é inspirada em atores e histórias que já escutei, foi uma questão de observar a vida. Com relação à reunião de amigos, me inspirei na psicoterapia”, explica o dramaturgo que construiu vários relatos muito profundos e substanciais para cada papel. Com a recepção que estão recebendo do público carioca, Odilon acredita ser possível repetir o sucesso da capital paulista.

Daisy Lucidi não pisava nos palcos há 30 anos (Foto: AgNews)

Um dos elementos imprescindíveis que estimulou Odilon a escrever esta narrativa foi convidar e abrir espaço para os idosos em cena. O diretor considera um absurdo o pouco espaço que esta classe recebe. “A nossa sociedade ocidental tem dificuldade de valorizar a terceira idade, conforme as pessoas vão ficando mais velhas mais são colocadas de lado. Com o aumento da expectativa de vida e da qualidade de vida, é possível viver por mais tempo com direito a uma saúde muito boa. O que fazer com esta galera que no auge da sua maturidade não se encaixa mais na sociedade? Como sempre fui muito ligado a isto, resolvi dar um espaço para estes atores e falar sobre este tema”, relembra. De acordo com Antônio Pitanga, a indiferença também pode ser vista no dia-a-dia da sociedade e isto precisa ser mudado. “Falta uma sensibilidade no estado para entender que esta é a fase do conhecimento. As pessoas cultivaram uma vida de experiências, criaram seus filhos, netos e até bisnetos. Todos estes valores são passados para os descendentes. Nós somos a referência de uma família. Em outros países, a terceira idade é muito valorizada, porque detém informações que os jovens ainda precisam batalhar para adquirir”, defende.

Para o elenco, a maior homenagem que puderam receber do dramaturgo foi estar em cena sem precisar interpretar seus anos de vida. “É uma peça com a terceira idade que não fala sobre a faixa etária, mas dos sentimentos e profundidades de cada um. Fiquei muito emocionada, na primeira vez que li a peça, com a preocupação do Odilon de abordar este tema dando espaço para nós”, comemora Suzana Faini. O espetáculo toca no amor, na sexualidade e nos preconceitos de cada personagem sem se importar que todos sejam mais velhos. “As pessoas precisam respeitar, entendendo as possibilidades individuais. Se cada um pudesse mostrar o seu trabalho, no seu ramo, estaria perfeito. Isto é um trabalho interno que deve ser cultivado por toda a sociedade. O ser humano, no geral, precisa ser mais respeitado”, complementa a atriz.

O texto de Odilon faz referência a Tempestade, de Shakespeare(Foto: AgNews)

Os atores acreditam que este espetáculo poderá incentivar os diretores a apostarem na classe mais velha. “Mostra que os atores com mais de setenta anos ainda estão no mercado e muito dispostos para trabalhar. Nós temos alegria e somos capazes de fazer tudo. A idade não é o nosso limite”, defende Regina Sampaio, que é a personagem stand by da peça caso alguém não possa participar em algum momento. Mesmo estando o elenco todo, Regina continua em cena com poucas falas. Além de incentivar a classe teatral, Antônio Pitanga acredita que o público idoso que for conferir a montagem pode se sentir mais apto a novas atividades. “Essa peça mostra para os mais velhos que é possível se arriscar, os incita a sair à rua e viver em vez de ficar na frente da televisão. A cultura, neste caso, tem o papel de abrir os corações e levar a discussão”, comemora o ator que não subia aos palcos há muito tempo ao ponto de sua neta não ter presenciado nenhuma atuação do rapaz.

Além de estimular a interpretação da classe mais experiente, Tania Bondezan acha necessário, também, incentivar os espetáculos em si. “Parece que o público perdeu o interesse por esta arte porque existem muitas mídias chamando a atenção”, lamenta a atriz.

A temporada no Rio vai até setembro (Foto: AgNews)

Serviço

LOCAL: Theatro Net Rio – Rua Siqueira Campos, 143/2º piso – Copacabana/RJ (estacionamento no local)

Tel:  (21) 2147-8060

HORÁRIOS: 5ª às 21h (até 24/08) / 5ª às 17h30 (a partir de 30/08), 6ª e sáb às 21h, dom às 17h30

INGRESSOS: R$120,00 (plateia) e R$ 100,00 (balcão) na bilheteria: diariamente das 10h às 22h, ou em www.ingressorapido.com.br , ou pelo tel (11) 4003-1212

CAPACIDADE: 622 lugares

GÊNERO: comédia

DURAÇÃO: 90 min

CLASSIFICAÇÃO: 12 anos

TEMPORADA: até 17 de setembro