Ana Abbott fala sobre o projeto Balé Mecânico que realiza ao redor do mundo, sobre carreira no cinema com as gravações de três filmes ao mesmo tempo e sobre suas composições pessoais


A atriz acabou de voltar da Lituânia e já embarcou em três produções seguidas. As filmagens de Praia Do Silêncio já terminaram, agora ela se dedica a Os Príncipes

Holanda, Inglaterra e Lituânia foram um dos países pelos quais Ana Abbott já passou levando sua visão diferenciada através do Balé Mecânico. O projeto é um tanto inusitado e está sendo desenvolvido pela própria sem incentivo há algum tempo. A atriz se posiciona na vitrine de diversas lojas na espera da reação do público que é sempre diversa. Muitas vezes, sem autorização e se arrisca para conseguir fazer seu trabalho artístico. “Conto até três e saio correndo”, brinca Ana. A ideia é fazer as pessoas se questionarem sobre a correria do dia a dia, pois por causa disso muitas vezes nem ao menos percebem que uma mulher de carne e osso está na frente delas em vez de um manequim. O projeto foi criado de forma totalmente autoral e a artista vê muitas perspectivas de futuro nele. “Grande parte dos meus projetos vêm através de uma intuição e ao escrever e colocar em palavras, compreendo o que quero. Acho que o balé mecânico veio de um sopro de vida que chegou em mim porque é algo estático, mas que existe. Dessa forma, gosto de deixar margem para a pessoa sentir o que ela quiser, não imponho qualquer tipo de sensação. Meu desejo com este projeto é causar sentimentos. As pessoas ficam curiosas, levam sustos, riem, sentem medo e se impressionam com a relação humana que funciona dentro de algo estático. Eu vou me ajustando de acordo com os acontecimentos. Na Lituânia, por exemplo, uma moça brigou comigo na língua local e não entendi absolutamente nada. É uma provocação que faço e estou aberta a todos os tipos de acontecimentos que possam vir a acontecer. Quero que o público se questione com relação ao mundo capitalista e sobre o corpo da mulher engessado para fazer parte de um padrão. Passamos pela rua e não paramos para observar e reflexionar”, contou a atriz.

Ana Abbott dentro de uma vitrine na Lituânia (Foto: Divulgação)

Ana acabou de voltar da Lituânia onde deu continuidade ao projeto do Balé Mecânico pelo mundo, no mês de junho. Até agora foi o país mais inusitado que ela se apresentou, o que foi um verdadeiro desafio. “Estava em Amsterdam em um período de férias quando uma colega de trabalho, a Anna Costa e Silva, disse que iria participar de uma mostra na Lituânia. Acabamos desenvolvendo uma pareceria artística e como era perto da onde eu estava, acabei indo. Foi muito inusitado para mim parar lá. Um impulso que deu certo pois, além de conhecer, minha passagem por lá foi bastante positiva”, relembrou.

O projeto de Ana não tem patrocinio (Foto: Divulgação)

Por ser um projeto único, a atriz está tendo que bancar seu desenvolvimento inteiro sozinha. Com relação a isto, Ana se mostra indignada pela falta de investimento do estado em projetos artísticos. A falta de pagamento das idealizações que já estavam garantidas, inclusive, afetou uma de suas peças. “Estou muito chateada com o boicote do fomento feito pelo Crivella que ele simplesmente não pagou. Espero que o Brasil passe por uma transformação porque é muito grave o que está acontecendo no país. O Crivella, o boicote e o retrocesso. A classe artística está se posicionando de alguma forma e isso é importante porque é algo grave. Muitas pessoas estão se ajudando através do crowdfunding. Como estou sem incentivo, no momento, me dedico a fazer o balé de forma independente, por exemplo”, criticou a atriz.

Ana Abbott durante as filmagens de ‘Praia do Silêncio’, no litoral paulista (Foto: Divulgação)

Atualmente, Ana se dedica a fazer praticamente dois filmes ao mesmo tempo. Assim que terminou de gravar ‘Praia do Silêncio’, do Francisco Costa, a mesma emendou com as filmagens atuais do longa ‘Os Príncipes’, Luiz Rosemberg Filho. “Foi uma correria e uma reviravolta muito grande. Um dia fiz praticamente os dois filmes juntos, porque sai do litoral de São Paulo de noite e no outro dia de tarde já estava no outro set. Duas personagens completamente diferentes, sendo uma forasteira surda e a outra prostituta. Mudar desta forma foi bastante desafiante porque busco fugir da caricatura, tento encontrar subjetividade e respeito”, relembrou. Tudo isso logo depois de voltar de uma viagem de trabalho da Lituânia.

Luiz Rosemberg Filho e Anna Abbott durante as gravações do filme (Foto: Divulgação)

O longa ‘Os Príncipes’ é o terceiro ao lado do diretor Rosemberg o que só prova que a química entre os dois está dando certo. “Ele é um mestre extremamente generoso, culto, ousado e com uma linguagem singular. O conheci ao fazer Dois Casamentos e não tinha nenhuma intimidade com ele. Junto disso, naquele filme, descobri um lado muito doce de mim ao interpretar alguém do interior”, informou. Ainda nesta película, ela contracenará, pela primeira vez, com o namorado, o ator Orã Figueiredo. “Foi divertido e ousado. Temos uma troca artística muito grande, nos compreendemos sem precisar falar nada. Foi engraçado”, comentou.

Filme ‘Os Príncipes’ com Ana Abbott e Orã Figueiredo nos bastidores (Foto: Divulgação)

Em Praia do Silêncio, Ana protagoniza uma forasteira surda. No filme Guerra do Paraguay, que ganhou o prêmio de melhor filme pela crítica do Festival Cine de Pernambuco, ela vive uma autista também dirigida por Rosemberg. Além disso, eventualmente, a atriz interpreta uma cega no espetáculo Alices, por estar substituindo uma das atrizes. Pode-se dizer, então, que a mulher conhece bem o mundo destas deficiências e ela não nega que precisou mergulhar profundamente neste universo. “Busco sempre assistir, ler e conhecer pessoas que tenham esta deficiência. No colégio, por exemplo, eu tinha um amigo com uma irmã autista e ainda me lembro disto por ser nova e isso ser impactante para mim. Além disso, dei uma aula particular para uma surda de presença no palco. Nunca ia imaginar que, um ano depois, ganharia este papel. Dessa forma, já tinha uma noção das dificuldades dessas pessoas de viver em sociedade. Por isso, quis abrir totalmente a minha percepção sensorial e periférica das coisas ao meu redor. Foco na proposta do lugar, na minha subjetividade, na observação do ambiente e com a compreensão do que o diretor está pedindo e por isso tenho que viver aquele momento”, explicou. Viver uma cega, uma surda e uma autista em um curto espaço de tempo exigiu de muito preparação corporal da atriz.

Ana em cena no filme Guerra do Paraguay (Foto: Divulgação)

Mesmo ainda sem data, Ana já sabe qual será seu próximo projeto na agenda com o término das filmagens de Os Príncipes. A atriz irá para o curta-metragem ‘Bento’, dirigido por Rodrigo Graciosa. A novidade do roteiro é trazer um universo fantástico como ferramenta para tratar de relacionamentos abusivos. No filme, os vampiros serão o principal mal da sociedade. “Esse curta traz uma abordagem fantástica ao transformar uma pessoa em um vampiro para falar de misoginia. Este gênero é pouco explorado no Brasil, o que é muito positivo. Este ser é uma metáfora no sentido de sugar o outro. Através da arte, nó temos que dar o nosso recado apoiando todos os movimentos importantes que estão acontecendo hoje em dia, como o LGBT, o dos índios, o dos negros e o das mulheres”, sugeriu.

Além de tantos projetos em andamento, Ana compõe inúmeras músicas que já foram gravadas, até mesmo pelos artistas ‘Forróçacana’ e ‘Cabelo’. Nas horas vagas, ela se dedica a botar para fora tudo o que está se passando. “Tenho um projeto musical chamado Bem Feito Para Mim que pretendo tornar um viés performático, nos palcos. Este projeto tem uma página no Facebook, mas de uma forma bem despretensiosa. Apesar disso, não tenho pretensão de virar cantora. Sempre gostei de escrever muito e tem vezes que nem ao menos canto as minhas canções. Para mim, é muito mais difícil escrever do que atuar por acreditar que as pessoas se desnudam mais desta forma. Tenho um Tumblr onde exponho mais o que sinto chamado Cabeça Barulho, com o auxílio da escrita e do audiovisual. Além disso, tenho o projeto de uma peça chamada A Vida Começa No Pântano”, relembrou. Ufa!