A moda encontra o cinema: pesquisadores brazucas rasgam seda e celulóide em evento latino de design


Acadêmicos promovem a interação entre as duas artes e discutem, em Buenos Aires, o caráter fake dos figurinos de época

O Brasil está enviando um bonde de pesquisadores de moda e cinema para Buenos Aires nesta terça feira. Explica-se: a Universidade de Palermo, na capital argentina, organiza esta semana a segunda edição do Encuentro Latino de La Moda, evento organizado pela instituição, que se dedica aos cursos de design e comunicação. Serão três dias dedicados ao design e à moda para o público acadêmico latino-americano, com destaque para as conferências que buscam estudar a interação entre moda e cinema, assunto que está dando pano para manga no evento.

Denise Trindade, doutora e professora da Universidade Estácio de Sá e autora do projeto de pesquisa Imaginários do Cinema – que estuda a sétima arte em várias vertentes e, entre elas, sua relação com a moda , já havia dado expediente na primeira edição do encontro ano passado. Dessa vez, ela resolveu convocar um seleto grupo de professores-pesquisadores da Estácio de Sá e da Universidade Federal do Rio de Janeiro, que irão apresentar seus textos mais recentes e dialogar com a platéia. Entre os textos que serão apresentados, os de Lucia Acar, Eliana Monteiro e de Flávio di Cola – mestre em comunicação e cultura pela UFRJ e coordenador do curso de cinema da Estácio. O curioso artigo de Flávio discute a autenticidade da moda nos filmes de época e celebra a escola de direção de Lucchino Visconti – um diretor detalhista quase despótico, capaz de enlouquecer sua equipe – e de seu colaborador mais constante, o figurinista Piero Tosi, que será homeageado na próxima festa do Oscar com um prêmio especial. Flávio comenta que, no backstage de O Leopardo, Visconti quase levou Tosi à loucura quando obrigou o amigo a desenhar uma roupa diferente para cada soldado que aparecia nas cenas de batalha da unificação italiana, mesmo se tratando de figurantes que apareciam ao fundo das tomadas. O argumento? Muito simples:  já que a guerra convocou ao front pessoas de várias camadas da sociedade, era fundamental revelar sob os uniformes militares as particularidades de cada um.

Loucura de cineasta ou não, Flávio afirma que “calibrar a fidelidade histórica com o repertório imaginário da plateia não é tarefa fácil.” E ainda cita as brigas homéricas do figurinista Walter Plankett com o produtor mão de ferro David O. Selznick durante as filmagens de “… E o Vento Levou”. Dizem que o diretor de figurino continuou afirmando até a sua morte que aquele era o seu pior trabalho e que foi obrigado a fazer o que não queria pelo produtor. Mas, quando vemos a cena em que Scarlett O’Hara detona uma cortina de veludo para fazer um modelito de festa, acabamos concordando que as concessões impingidas  por Selznick tinham toda razão!

Entre os palestrantes nacionais, uma merece destaque: a festejada Nízia Villaça, super conhecida nos meios acadêmicos por ser a doutora que introduziu os estudos de moda na ECO – Escola de Comunicação da UFRJ. Como se sabe, a comunidade acadêmica brasileira não costumava encarar a moda como estudo comportamental, mas apenas como pura frescura. Foi preciso Nízia – mestre em literatura portuguesa e doutora em teoria literária pela UFRJ, além de um pós-doutorado em Sorbonne – bater às tamancas e inserir o projeto de pesquisa A Construção do corpo na mídia: texto e imagem na ECO para que o assunto deixasse de ser considerado firula e ganhasse o respeito do meio.

* Por Alexandre Schnabl