Pocotó! Zeca Baleiro se transforma em “cavalo do Zé Ramalho” em cover do cantor paraibano!


Na Miranda, o intérprete emociona a plateia e diz se sentir honrado de poder homenagear um dos seus maiores ídolos

*Por João Ker

“Hoje sou um cavalo de Zé Ramalho“, declara Zeca Baleiro durante o show que fez nesta noite de sexta-feira (25/04) na Miranda, Rio, como parte do projeto Banco do Brasil Covers. Na setlist, apenas músicas do paraibano que conseguiu, em sua trajetória, fundir rock com cultura nordestina como ninguém.  A apresentação é intimista, emocionante e conta tanto com hits como com b-sides do “Rei do Rock”. “Eu sou velho, gente. Sou do tempo que existia lado B nos discos”, brinca Zeca.

Baleiro sobe ao palco vestindo preto da cabeça aos pés: chapéus, camisa, calça, sapato e até um cachecol de gosto peculiar (que mais tarde foi, felizmente, dispensado). Novaiorquino? Papa-defunto? Mafioso? Não adianta tentar traduzir. Baleiro é simplesmente Baleiro. Ou Zeca. E está ótimo assim. O espetáculo começa um pouco sombrio, com uma “Ave de Prata” cantada baixinho, exigindo o silêncio absoluto da plateia. Em seguida, um rearranjo cheio de guitarras e apresentado com voz lânguida de “A Terceira Lâmina” daria o tom que o show seguiria pelo resto da noite: Zeca fazendo suas próprias versões de Zé e, neste processo, investindo mais na emoção com que interpretava as letras psicodélicas, amarguradas e alegres do que em alcance vocal.

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(Foto: Ricardo Ferreira)

O primeiro pique de animação vem com a “Dança Das Borboletas”. A plateia aplaude logo no início – do mesmo jeito que faz ao final de todas as músicas apresentadas – e alguns gritinhos tímidos de “uhul” podem ser ouvidos no fundo. O clima é mantido em “Beira-Mar” e o público, impedido de se jogar na pista para não atrapalhar aqueles que estão mais atrás, fica rebolando no assento, alguns segurando crianças de colo enquanto se divertem. E então vem um dos maiores sucessos da longa carreira de Zé Ramalho: “Chão de Giz”, sua famosa parceria com a prima Elba Ramalho. Zeca arrepia os cabelos do braço e da nuca em uma versão que começa melancólica e mais vagarosa que a original, mas depois se rende a uma fúria emocionante (não tão boa quanto na voz de Elba, mas isso é quase impossível).

Seguem mais algumas versões com levadinha rock de “Desejo de Mouro” e “Não Existe Molhado Igual ao Pranto” e, então, um dos pontos mais altos do show. Em uma rendição com rancor perceptível no olhar e na voz, Zeca praticamente declama “Garoto de Aluguel”. Na sequência, o próprio Zé Ramalho faz uma aparição quase sobrenatural nos backing vocals pré-gravados de “Rei do Rock” e, em meio a guitarras psicodélicas, Baleiro incorpora Bethânia e faz um remix com pegada de rap enquanto, mais uma vez, declama os versos da música.  “Essa música faz parte de um álbum colaborativo que o Zé gravou em 2007, chamado ‘Parceria dos Viajantes’, e é um duo da qual eu me orgulho muito”, comenta Zeca, responsável pela composição. “Quando fui chamado para fazer esse show, comecei a pensar na vida e na trajetória dele, então decidimos fazer uma versão meio rap para esse rock cigano.”

(Foto: Ricardo Ferreira)

(Foto: Ricardo Ferreira)

“Eu me lembro de ter uns 11, 12 anos quando ouvi a próxima música pela primeira vez na rádio. Na época, eu não fazia uso de psicotrópicos, mas eu fiquei tão estupefato que fui transportado para outra dimensão – onde fiquei por algum tempo ainda”, brinca o cantor, antes de cantar “Vila do Sossego”. Como diz o ditado: é melhor dar dinheiro, do que dar intimidade. Ao final da canção, ele parou para interagir de novo com o público – agora muito mais “soltinho” – e, enquanto falava do Maranhão, alguém no fundo grita: Sarney!!! Sem perder a compostura, Zeca respondeu: “O quê que eu posso fazer? Tenho uma infância cristã, não posso matar ninguém”, revela, antes de dar continuidade ao espetáculo.

(Foto: Ricardo Ferreira)

(Foto: Ricardo Ferreira)

Começa então o arrasta pé e o público, muito mais empolgado, ajuda Zeca a cantar “Táxi Lunar”, “Um Pequeno Xote” (“essa é uma pequena pérola, uma deliciosa obra-prima”) e “Pelo Vinho e Pelo Pão”. O cantor dá então uma breve pausa e volta com guitarras alucinantes em releituras envolventes de “Eternas Ondas” e “Kryptônia”. Apesar de ser um show apenas de covers do Zé Ramalho, Zeca Baleiro não resiste à pressão do público e, de boa, canta, acompanhado de todos, “Telegrama”:“O show foi ótimo. Eu tô feliz, a banda tá feliz e vocês viram que eu fiz um show do Zé, certo?”, se explica antes de cantar que tinha acordado com vontade de beijar o português da padaria. Risos.

O show termina em dó maior, clima de celebração com “Admirável Gado Novo” seguida pela plateia festiva e, impossível de escutar parado, “Frevo de Mulher”. Pode ser que nem Zeca e nem Zé sejam os reis do rock, mas a MPB é bem melhor com suas respectivas guitarras dentro dela.