No show dos Titãs que agitou nesse finde o Circo Voador, um bate-bola exclusivo com Tony Bellotto!


Nos bastidores do show ‘Inédito’, o guitarrista fala sobre os 30 anos de carreira da banda, o novo cenário do rock e a ascensão do rap como música com viés crítico. Confira!

Depois de comemorarem 30 anos de carreira com a turnê ‘Cabeça Dinossauro Ao vivo’ – um retorno ao seu clássico álbum de 1986 – os Titãs retornaram ao Circo Voador, nesta sexta (13), para apresentar o espetáculo ‘Titãs -Inédito’. Com mais de três décadas de estrada, ficou claro que  grupo é capaz de se renovar a cada dia e, ao contrário dos dinossauros, que não sobreviveram a um cataclisma, a banda é capaz de resistir a qualquer meteoro musical, se mantendo íntegra em sua essência. Isto pode ser comprovado, inclusive, pelo inusitado formato que os rapazes trouxeram para o novo show.

Dividido em duas partes, o primeiro round do espetáculo começou por volta de 23h30 e contou com 10 (sim, dez!) músicas inéditas no repertório, cantadas em sequência, sem serem intercaladas com sucessos, como costuma-se ver nos shows. Entre as faixas de lançamento estavam: ‘Baião de dois’, ‘Não pode’, ‘Terra à vista’, ‘Mensageiro da desgraça’, entre outras novidades que foram apresentadas ao público em uma apresentação calorosa.

Entretanto, como era de se esperar, o auge da noite foi quando a banda virou o disco para o lado B e, com aquela energia contagiante que traz desde a década de 1980, fez o a plateia sair do chão e entoar, em alto e bom som, sucessos como ‘Desordem’, ‘Homem primata, ‘Sonífera ilha’, ‘Flores’ e ‘Bichos escrotos’.

Aproveitando o ensejo, nos bastidores, batemos um papo com o guitarrista-maridão de Malu Mader, Tony Bellotto. Durante essa conversa, o músico falou sobre os 30 anos de carreira, o novo cenário do rock e a ascensão do rap como música com viés crítico, oriunda do rock dos anos 1980. Confira abaixo!

Fotos: Vinícius Pereira

HT: Depois de três décadas de carreira, fazer um show praticamente inteiro com músicas inéditas deve ser um grande desafio, já que o público fiel costuma ter “sede” de clássicos. De que forma vocês contornam essa exigência dos fãs?

Na verdade, chama-se ‘Inédito’, mas dividimos o repertório em duas partes: começamos o show com 10 músicas inéditas, direto, uma atrás da outra. Depois, compensamos os fãs com uma segunda parte, composta por aquelas faixas mais conhecidas da nossa carreira. É uma coisa muito rara para uma banda consagrada, mas achamos um desafio interessante. Depois de tantos anos na estrada, acho que o nosso público também espera algo inovador. O mercado da música atualmente está muito acomodado, e as bandas parecem estar com medo de criar algo inusitado e “incomodar” os fãs, que têm a expectativa de ir ao show e só ouvir clássicos. Ir contra a corrente faz parte do Titãs. Já fizemos esse show em alguns estados e tudo foi super bem aceito.

HT: Em 30 anos juntos, qual foi a maior dificuldade e a maior glória pela qual a banda passou? Fariam de outra forma, se pudesse voltar no tempo?

Sem dúvidas, nossa maior dificuldade foi a morte do Marcelo (Fromer, ex integrante da banda que morreu em um acidente). Perdemos mais que um músico, um grande amigo e companheiro. Foi um buraco muito difícil de ser preenchido, uma dor imensa. Mas, nos Titãs, temos um mecanismo muito legal de superação, criado e sustentado por nós mesmos. Até hoje lembramos dele com muito carinho em cada show. Quanto ao maior momento da nossa carreira, são diversos, só temos a agradecer. Mas, recentemente, tivemos uma prova do nosso valor e importância para música, quando gravamos o DVD do ‘Cabeça Dinossauro’, no próprio Circo Voador, que estava lotado. Recebemos o carinho de um público muito entusiasmado, como se fosse a primeira vez que ouviam aquelas músicas, foi um momento único.

HT: O Cabeça Dinossauro, de 86, é considerado até hoje um dos melhores discos de rock nacional, além de ser o mais marcante da carreira do Titãs. Porém, em 97, a banda lançou um álbum acústico, com pegada mais pop, que deixou certa dúvida nos fãs quanto à mudança de estilo do grupo. Para o disco que será lançado em 2014, com músicas inéditas, podemos esperar algo mais rock’n’roll ou baladinhas pop?

Ah, sem dúvidas o novo disco é bem rock’n’roll! Foi uma decisão que tomamos, principalmente depois de ver a reação do nosso público com a turnê com o ‘Cabeça Dinossauro’. Nós temos essa identidade crítica, questionadora, então nosso próximo disco vai seguir essa linha. Porém, vale lembrar que o momento do acústico também foi muito bacana. Não curtimos de ficar reféns de uma coisa só.

HT: O fato de a banda ter resgatado o repertório do ‘Cabeça Dinossauro’ em comemoração aos 30 anos de estrada, no mesmo momento em que o povo brasileiro, principalmente os jovens, começou a ter um engajamento político mais apurado, ajudou a renovar o público da banda?

Acredito que sim! Inclusive, é algo que temos reparado nos shows, como o que fizemos recentemente Circuito do Banco do Brasil, no Parque dos Atletas. Vimos uma galera bem nova, que não tinha nem nascido quando lançamos esse disco. A própria canção ‘Desordem’, de 88, tem mais de 20 anos, mas poderia ter sido criada hoje. Tem muita relação com o que o Brasil está vivendo atualmente, a indignação do povo com o governo e tudo mais. É muito legal para nós, artistas, ver que algo que fizemos 20 anos atrás ainda faça sentido para a música, como arte.

 HT: Em uma entrevista, o Paulo Miklos disse que o rock perdeu a agressividade dos anos 80. Vocês acompanham o novo cenário da música? Qual banda, atual, arriscariam em dizer que mantém raízes do que se pode chamar de um rock ‘pesado’ e cheio de atitude?

Eu não acompanho tanto… Mas não daria destaque somente para o rock. A nova geração do rap, como o Criolo e o Emicida, trazem nas músicas deles, a essência que o rock dos anos 80 trazia. Gosto do rock atual, mas acho que o rap na verdade está cumprindo essa função que as bandas de rock exerceram um dia.

HT: Enquanto forma de atualização com as novidades do cenário musical, você diria que a música mais recente – com outra proposta de som – influencia o trabalho de vocês ou se distancia demais do conjunto, por vocês já terem uma identidade?

A gente procura sempre se renovar, mas é claro, já temos uma linguagem, então, buscamos um equilíbrio, um meio-termo. Temos que nos renovar, mas não podemos perder a identidade. É como se tivéssemos que mudar para continuar igual, dá para entender? Tentamos sempre inovar, colocar um elemento novo, mas sem perder a personalidade pela qual a banda é conhecida.