Mestre Gilberto Gil: gênio ou entidade da música? Ou as duas coisas?


Lançamento da turnê nacional “Gilbertos Samba”, no Theatro Net Rio, deixou a plateia de músicos e famosos em estado de alfa junto com o artista

Uma apresentação de Gilberto Gil sempre vai além da presença de um artista genial, é uma experiência sensorial, para muitos, transcendental. A simples ideia de assistir Gil em repertório que consagrou João Gilberto já merece todas as reverências possíveis e todas as palavras cabíveis para descrever um encontro de gênios. Sendo assim, vamos tentar, humildemente, dizer o que foi o lançamento da turnê nacional de seu mais recente e bombástico álbum “Gilbertos Samba” no Palco Petrobras Premmia, do Theatro Net Rio. Foi uma noite de festa, já que o tradicional palco de Copacabana, onde funcionou o antigo Teatro Tereza Rachel, completa dois anos de atividades. Na ilustre plateia, um time dos mais talentosos artistas, com grandes músicos e integrantes da cena cultural carioca. Um badalo de primeira!

A maneira como Seu Gilberto conduz a plateia e a leva para a mesma sintonia que ele é impressionante. Parece mesmo que alguma coisa além da nossa percepção acontece quando o Gil canta e toca, sente e faz suas pausas no palco. A maior parte dos convidados presentes descreve o fato com uma frase: Gil é uma entidade! Todo de branco, mas bem jovial no figurino Osklen, ele chega ao palco que, quando iluminado, revela o cenário que combina com a sutileza do artista, feito pelo músico Domenico Lancellotti que também assina o projeto gráfico ao lado de Celina Kuschnir. A todo tempo, na medida em que se entrega mais à experiência transcendental, que ajuda mais ainda sendo naquele teatro de clima intimista e boa acústica, a audição se aprofunda e surgem inúmeros detalhes e nuances. A sintonia entre os músicos da banda e forma como davam vida aos instrumentos acústicos e eletrônicos, a própria genialidade do mestre Gil ao conduzir a sonoridade, dividiam a atenção com uma, entre tantas, das coisas mais marcantes do show e do recente trabalho: o violão de Gil estava impecável. Talvez ele tenha percebido o quão redondo era mostrar que o violão é a veia que conduz todo o trabalho, já que foi por ouvir João Gilberto em 1959, em uma transmissão de Chega de Saudade pela Rádio Bahia, que o então rapaz Gilberto Passos Gil Moreira decidiu trocar o acordeom pelo violão. Ele tinha 17 anos e hoje aos 71, sendo ele próprio um mestre da música nacional, se enxerga como discípulo de João.

Este slideshow necessita de JavaScript.

Fotos: Divulgação/Zeca Santos

O jornalista Guilherme Fiúza é um dos que crêem no protagonismo do violão de Gil no espetáculo. “Ele sempre foi um grande instrumentista, mas agora está mais rebuscado. Parece que ele mergulhou mais ainda no violão neste trabalho. Está tocando absurdamente”, diz Fiúza. Já sua namorada, a socialite Narcisa Tamborindeguy, acompanhada também da irmã, Alice Tamborindeguy estava em estado de êxtase e só conseguiu dizer: “Sensacional. Ai que sensação!”. Mas o que foi quase uma unanimidade é o fato de mestre Gilberto nos levar ao nirvana. Como disse, entre muitos outros, o músico Carlinhos de Jesus: “Gil é uma entidade!”. Afinal, o que faz com que Gil tenha a capacidade de trazer a plateia para esta mesma sintonia? Uma qualidade mística? A genialidade? A enorme musicalidade? A melhor pessoa para responder nos diz, sua filha, Preta Gil. “Você disse tudo, é isso mesmo! São as duas coisas. Tem a ver com a seriedade que ele tem com seu trabalho, a qualidade musical. Mas a sua espiritualidade forte sintoniza tudo isso, sente a música e faz as pessoas sentirem junto”, afirma Pretinha toda apaixonada. Da mesma forma acredita a atriz Debora Bloch: “Gil é sempre uma experiência transcendental!”, diz.

Já a cantora Baby do Brasil exclui qualquer responsabilidade à qualidades místicas ou espirituais. “Gil é um dos maiores músicos de todos os tempos. Por isso, no seu show, ele insere atmosferas musicais, conduzindo a plateia ao caminho sonoro que ele quer”, explica. Da mesma forma pensa o músico Jards Macalé, que foi saudado por Gil lá mesmo do palco. E, ao lado do amigo Frejat, dizia: “Entidade nada, o cara é um grande músico mesmo. Imagina que eu ou o Frejat podemos colocar todo mundo cantando. Mas o Gil já coloca logo todo mundo fora do lugar. É sonoridade mesmo!”. De fato foi uma noite de grande entrega, sobretudo no momento em que o artista toca pela primeira vez a música “Gilbertos”. “É a primeira vez que toco essa música, aprendi a tocar ela aqui e agora com vocês”, diz, sendo aclamado pela plateia, daquele jeito vagaroso de falar como se nada o tirasse daquele canal entre seus ouvidos e a música. Reza a lenda, nos bares soteropolitanos, que uma vez um assaltante entrou na casa de Gil, enquanto ele estava concentrado estudando suas notas musicais no violão, e diz: “Cadê o cofre, Seu Gilberto!” e o mestre Gil responde, após enorme pausa: “Faça seu trabalho direito, procure, eu estou cá fazendo o meu!”. E o assaltante baiano sai respeitando a ordem do mestre, decepcionado com sua própria mediocridade.

Este slideshow necessita de JavaScript.

Fotos: Divulgação/Zeca Santos