Além de ator, Mouhamed Harfouch mergulha na carreira musical e faz show no Rio após lançar o primeiro EP: “Eu encaro o canto como uma extensão da minha arte”


Depois de um ano conturbado para a classe artística brasileira, o ator, cantor e compositor comentou sobre as críticas à lei Rouanet durante o processo de extinção do Ministério da Cultura, em maio. “Se há correções, eu não tenho dúvidas que elas precisam ser feitas. Se alguém errou, que pague por isso. Mas eu acredito que se precisa ter ética, respeito e compromisso com todas as áreas”

“O artista não pode estar em posição confortável, ele precisa sempre ser desafiado”. Com esse pensamento pontuado com um pouco de diversão e muito talento, Mouhamed Harfouch faz seu primeiro show solo nesta sexta-feira como cantor. A apresentação, que será no Beco das Garrafas, em Copacabana, nesta sexta-feira, contará com músicas autorais que fazem parte de seu primeiro EP, “Flores Pisadas”, lançado há dois meses, e canções de ícones da música brasileira que influenciaram o ator, cantor e compositor nesta nova vertente artística da carreira. Em entrevista exclusiva ao HT, Mouhamed Harfouch contou que o show desta sexta feira será um momento de divertimento e celebração. “Esse encontro será para celebrar a realização do meu primeiro EP e comemorar o final do ano. Mas também será uma oportunidade de nós exorcizarmos, na medida do possível, esse ano difícil. Como minha avó sempre me disse: ‘quem canta os males espanta’. Então, no palco, eu vou apresentar as seis faixas do meu primeiro trabalho e mais três autorais que não entraram para o EP. Além das minhas composições, vou cantar músicas de artistas que me inspiram na vida, na arte e na música, como Nando Reis, Zé Ramalho e Paulinho Moska”, adiantou.

Mouhamed Harfouch se apresenta nesta sexta-feira em Copacabana (Foto: Divulgação)

Mouhamed Harfouch se apresenta nesta sexta-feira em Copacabana (Foto: Divulgação)

Conhecido por seu trabalho como ator na televisão e no teatro, Mouhamed Harfouch revelou que a veia musical sempre existiu. Inclusive a de compositor. Segundo ele, que coleciona dezenas de letras próprias, o ato de escrever é quase que como uma válvula de escape. “Compor para mim é como uma reflexão, uma terapia. É um diário sonoro. Certa vez eu fiz um espetáculo em que eu ficava nu em cena. Hoje, eu me sinto muito mais exposto com as minhas canções do que nessa experiência no palco. As letras são muito íntimas e eu me sinto me revelando para o público. Mas isso também é muito bom, porque é uma forma das pessoas que já conhecem o meu trabalho como ator, me descobrirem de verdade”, disse Mouhamed Harfouch que compõe desde os 15 anos de idade. “Para este EP, eu recuperei todas as minhas músicas que eu escrevi no decorrer do tempo. Depois de muito estudo, nós selecionamos seis músicas para entrar neste primeiro projeto. Na verdade, a sexta nasceu no meio do álbum. Durante esta experiência, eu acho que o meu lado musical aflorou muito. Então, acabou que eu escrevi a canção ‘Flores Pisadas’, que inclusive é o nome do EP, em uma manhã de forma muito espontânea. Eu já tinha essa melodia há dez anos, mas ainda não havia feito a letra”, completou o artista que afirmou que faz música para colocar ideias e reflexões no papel e dar voz aos sentimentos e pensamentos.

Por falar na música “Flores Pisadas”, que Mouhamed Harfouch definiu como a tônica do EP, o ator e cantor contou que a letra e a expressão surgiu de uma reflexão do nosso cotidiano. Segundo ele, que respira arte de diferentes maneiras, a correria do dia-a-dia está fazendo com que as pessoas passem pelas expressões culturais sem nem percebê-la. “Eu acho que esse EP fala da poesia amassada do cotidiano. Nós estamos sempre apressados, vidrados na tela do celular ou do tablet e querendo fazer que um dia com 24 horas dure 48 e até 72 horas. Mas isso tem um custo. Eu acho que cada vez mais nós não estamos vendo a poesia do nosso dia-a-dia passar. A arte pode estar em uma árvore, em um artista de rua que você passou e nem percebeu etc. O nosso olhar apressado não consegue mais parar para identificar e contemplar esses momentos e detalhes”, analisou.

Segundo o ator, cantor e compositor, a expressão "Flores Pisadas" traduz a correria do dia-a-dia que ignora a arte e os detalhes (Foto: Divulgação)

Segundo o ator, cantor e compositor, a expressão “Flores Pisadas” traduz a correria do dia-a-dia que ignora a arte e os detalhes da vida (Foto: Divulgação)

Apesar de adormecido, o gosto de Mouhamed Harfouch pela musica sempre esteve presente. E foi quando integrou o elenco do musical “Ou Tudo ou Nada” que tudo veio à tona. “Para o espetáculo, eu voltei a estudar muito o canto e acabei me aproximando novamente da realidade musical. Eu vivi um ano e meio intensamente de atuação e música quando estive em cartaz”, relembrou Mouhamed Harfouch que teve um incentivo de um ex-companheiro de banda. “Um dia, eu encontrei um amigo que me perguntou se eu não iria fazer nada com todas aquelas composições. Como ele me disse, eu não poderia deixá-las guardada sem que ninguém as ouvisse. Foi então que ele me pediu para fazer uma letra, a ‘Tudo Acabou’, sobre um término de relacionamento que ele teve. O resultado ficou bom e nós decidimos ir para o estúdio. A partir daí, tudo começou a acontecer para mim”, narrou.

Incentivado por Emanuelle Araújo e Lan Lan, Mouhamed Harfouch seguiu com a brincadeira que foi ficando cada vez mais séria. “Eu costumo dizer que esse meu amigo me deu asas. As músicas foram ganhando musculaturas que me faziam querer vê-las realizadas. E é isso que representa o meu EP: uma realização. Neste show de sexta feira, eu vou ter uma concretização física desse repertório que eu estou trabalho há um ano e meio de forma totalmente independente e autoral. A palavra chave de tudo isso, para mim, é prazer e divertimento. Eu pude dar asas e sensibilidade a esse meu lado artista, que é essencial dentro de mim”, relatou. Mouhamed Harfouch ainda fez questão de frisar que este não é um trabalho pessoal.

Capa do EP "Flores Pisadas", o primeiro de Mouhamed Harfouch (Foto: Divulgação)

Capa do EP “Flores Pisadas”, o primeiro de Mouhamed Harfouch (Foto: Divulgação)

Se a pluralidade da carreira artística de Mouhamed Harfouch já foi comprovada, a diversidade musical de seu trabalho é inquestionável. Em “Flores Pisadas”, o artista mistura suas influências árabes, com um pouco de MPB e pitadas de rock. Se foi tudo pensado propositalmente? “Eu não faço ideia de como eu fiz isso. Juro que foi totalmente empírico”, confessou aos risos. “O meu padrinho era músico e eu sempre gostei de violão. Mas, como eu não sabia tocar nenhuma música, eu comecei a criar minhas próprias canções para poder cantá-las. Como as pessoas foram gostando, eu continuei. Uma vez já me disseram que tem um pouco do Nordeste brasileiro na minha música também. Mas eu garanto que nunca quis fazer isso. Hoje eu vejo que eu tinha todas essas influências dentro de mim e que foram expostas e reveladas no momento em que eu me expressei musicalmente”, argumentou Mouhamed que é filho de árabe e mãe brasileira.

Sobre os planos para o futuro como músico, ele adianta: “Acho que é muito cedo para prever”. Para ele, o mais importante é que suas músicas cheguem às pessoas e tenham vida própria. “Eu não quero forçar nada. Esse projeto vai ter o tamanho que ele tiver que ter, e que eu ainda não sei qual será. É prazeroso e divertido para mim poder mostrar esse outro lado do artista. Mas a prioridade da minha carreira continua sendo a minha profissão de ator. O lado cantor eu encaro como um divertimento paralelo”, disse.

Além da experiência como cantor, definida como uma divertimento prazeroso, Mouhamed Harfouch segue na atuação (Foto: Divulgação)

Além da experiência como cantor, definida como uma divertimento prazeroso, Mouhamed Harfouch segue na atuação (Foto: Divulgação)

Por falar na carreira como ator, Mouhamed Harfouch adiantou que 2017 será um ano de muito trabalho. Na televisão, ele já tem uma novela garantida. Porém, misteriosa. Sobre o próximo trabalho na Globo, o ator não nos adiantou muitas informações. No teatro, Mouhamed tem um projeto com Nathalia Timberg na peça “Quando For Mãe Quero Amar Desse Jeito”. Como nos revelou, o ator é super fã da diva dos palcos brasileiros e até já foi seu vizinho.

Outro projeto de Mouhamed Harfouch para o teatro em 2017 é o monólogo “O Homem de Lata”. Sobre este espetáculo, que foi escrito pelo próprio ator, ele nos contou que há dois anos tenta captar recursos para poder estrear a peça. E, como adiantou sobre o monólogo que deverá estrear no ano que vem, o texto fala sobre o homem contemporâneo. Ah, e ainda tem a segunda temporada da série “Os Toques de Dalila”, no Multishow.

Ufa! Mas se você pensa que os trabalhos de Mouhamed Harfouch para 2017 terminaram, informamos que está enganado. Além da agitada carreira artística, o ator, cantor e compositor ainda terá mais uma missão. Aliás, a mais importante: Mouhamed Harfouch será pai pela segunda vez. Em uma mistura de euforia e insegurança, ele nos contou que teme pelo futuro incerto do Brasil. “Nós estamos vivendo tempos que não sabemos para onde estamos caminhando. Eu acho que este é um momento delicado, seja politicamente ou institucionalmente. A insegurança está presente na vida de todos os brasileiros com um constante medo de perder o emprego, piorar a crise econômica etc. É uma preocupação constante que só piora quando percebemos que há diferentes tipos de corrupção espalhadas por vários setores. Eu acho que a vida é um eterno andar na corda bamba e que o Bento (seu futuro filho) vai chegar como uma benção para esse momento. Nós temos que continuar sempre lutando e não podemos perder a vontade”, disse.

Em 2017, Mouhamed Harfouch será pai de seu segundo filho (Foto: Divulgação)

Em 2017, Mouhamed Harfouch será pai de seu segundo filho (Foto: Divulgação)

Porém, quando a insegurança aperta, Mouhamed Harfouch contou que se lembra de uma história muito próxima: a de seu pai. Fugido da guerra da Síria, ele veio com 17 anos para o Brasil sem emprego, casa ou qualquer garantia. “Quando eu tenho dúvidas, eu penso nele e vejo que podemos encontrar solução para qualquer situação. Tanto ele quanto minha mãe me mostraram que tudo pode ter um jeito. Com eles não tinha tempo ruim. E olha que eles passaram por diversas crises e problemas econômicos tão sérios ou até mais que os atuais. Então, é seguir andando com a cabeça erguida e olhar para frente com coragem”, concluiu.

Por fim, Mouhamed Harfouch acrescentou sua opinião como cidadão e artista sobre todo esse quadro de transformações que o Brasil enfrentou em 2016. Em uma volta ao tempo, o ator relembrou o caso da extinção do Ministério da Cultura e o questionamento do uso da lei Rouanet. “Neste cenário, nós tivemos os artistas sendo tratados de forma pejorativa, como se ‘mamassem nas tetas do governo’. Isso me mostrou que as pessoas estão muito raivosas e odiosas quando não concordam com a opinião do outro. Eu acho que a lei Rouanet é uma aliada da cultura e não pode ser demonizada desta maneira. Se há correções, eu não tenho dúvidas que elas precisam ser feitas. Se alguém errou, que pague por isso. Mas eu acredito que se precisa ter ética, respeito e compromisso com todas as áreas. Um país sem cultura perde a sua identidade também. E eu acho que aqui no Brasil as dificuldades são tantas que, para ser artista  é preciso resistir. Eu não digo isso só por mim. Seja na arte de rua, de circo, de teatro, da música ou que qualquer outra, esse trabalho precisa ser respeitado. Fora que este é um setor que gera inúmeros empregos. Ou seja, eu acho que toda uma classe artística não pode ser menosprezada por causa do erro de algumas pessoas”, manifestou-se o ator Mouhamed Harfouch.