SPFW verão 16 #day 2: da Amazônia minimalista da Osklen à homenagem a Charlotte Rampling por Thairine Garcia na Lilly Sarti


Dia se destaca pelos desfiles poderosos de moda praia da Água de Coco e Triya em maratona étnica que foi do Ceará a Marrakesh e privilegiou sereias urbanas

O segundo dia da edição verão 16 da São Paulo Fashion Week começou com os desfiles externos de Paula Raia em sua casa e da Osklen, na Galeria Bolsa de Arte. Enquanto a primeira optou por uma série de looks que praticamente são a evolução do trabalho apresentado na coleção anterior, Oskar Metsavaht volta seu olhar para a Amazônia. No caso, para a tribo dos Ashaninka, povo com ascendência inca e longa permanência na região, conhecido por repelir invasores até a fase do extrativismo do Ciclo da Borracha, no Século XIX. Nas últimas décadas, essa cultura tem se destacado pelo combate à exploração madeireira, o que torna sua existência significativa dentro do contexto atual.

Paula Raia continua brincando com formas e materiais dentro de sua visão peculiar de moda, como num experimento de cientista têxtil. Dessa vez, ela pensou em sereias, tema que seria visto mais tarde também no último desfile da noite, na Triya. E, mais um vez direto da sala de estar de sua casa, a anfitriã brinca com vestidos brancos e off white com direito a telas que são redes de pescador, no sentido literal ou figurado, além de transparências que parecem conduzir a apresentação. Tudo muito leve e diáfano, não como essas mulheres metade humanas, metade peixe, mas anêmonas das profundezas marinhas, prontas para assumir sua porção festa no guardarroupa da mais ousadas. Ou Yemanjás dignas de transformar casamento em rito conceitual.

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A Osklen optou por uma apresentação petit comité, somente com coleção feminina, preservando seu DNA urbano contemporâneo e apenas adicionando um certo aroma étnico a partir daquilo que o tema pedia. No caso, isso significa dizer que a grife aproveitou os grafismos em preto, branco e vermelho-urucum dos Ashaninka para salpicá-los em seu estilo inorgânico-futurista, usando estas referências indígenas sobre o suporte das peças, sem abrir mão de sua essência. Como, por exemplo, na hora de recriar as formas quadradas da indumentária da tribo em peças que são a cara da grife!

Nessa interpretação que esbarra na leitura étnica, a marca estiliza ao extremo os códigos inseridos nessa cultura indígena, como no uso de espaços laterais que seriam encontrados nas tangas. Assim, montagens minimalistas surgem adornadas por prints saídos dessa pesquisa, como penas gigantes localizadas em túnicas ou aplicações de franjas em ráfia, usadas em detalhes e também nas sandálias.

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Imagina Cara Delavigne dando aquela passadinha por Marrakesh na vibe de garota globetrotter, circulando pelos souks com seus modelitos de gossip girl em busca de precisosidades para temperar seu guardarroupa, dando aquele rolé esperto pela praça Djemaa El Fna – o centro pulsante da parte antiga da cidade marroquina, repleto de barraquinhas de especiarias, macaquinhos comedores de tâmaras prontos para serem alugados para fotos com turistas e até encantadores de cobra naja. É com esse espírito que a Ellus traz para o próximo verão um mergulho profundo na cultura local, mas com a visão de quem é do ocidente, flana por esse lugar exótico. A inspiração nos bérberes e tuaregues surge diluída nesta coleção criada por Rodolfo de Souza e Adriana Bozon, como se o jeanswear da marca sofresse uma interferênia bacana dessa paragem para lá de exotique.

As túnicas e lenços típicos dos locais viram pretexto para amarrações e panos esvoaçantes inseridos em ótimas jaquetas, tops, skinnys e calças cropped concebidos em denim natural, escuro, sem lavagem ou em jeans color, tudo bruto como um beduíno predisposto a enfrentar uma tempestade de areia no palmeiral que circunda a cidade. Hum, sem dúvida, os looks em sarja são o que há de melhor nessa coleção, dando o contrabalanço para peças fluidas em prata ou arabescos em lamês adamascados.

Ainda bem que, na imersão por esse Marrocos, existem boas peças sportswear que traduzem o DNA da marca e até hot pants que imprimem dignidade ao conjunto da obra, com acessórios desenvolvidos in loco – como bolsas de tapeçaria com berloques em prata pendurados. Tudo envergado por um casting da hora, capitaneado pelas Carois Trentini, Francischini e Ribeiro.

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Ainda no pacote étnico do dia, a Água de Coco resolveu valorizar a prata da casa, no caso, o Ceará, estado onde a marca está sediada. Liana Thomaz recita uma poderosa ode fashion com peças que mesclam com beleza única estampas com bordado e acabamentos artesanais da região, muitas delas indo além da praia e se constituindo em itens prontos para serem usados bem longe da areia. Nesse primoroso trabalho que traz estampas de cactos, velas de jangadas, falésias e arabescos misturados a todos os tipos de renda – bilro, renascença, filé mais bordado richelieu –, não há espaço para lero-lero sobre ser usável ou não, o importante é mostrar a criatividade.

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Sempre antenada com aquilo que suas clientes consomem, Lilly Sarti reinventa seu estilo próprio acrescentando ao aroma dos anos 1970 uma homenagem às beldades inglesas que surgiram no cinema da época: Jacqueline Bisset e Charlotte Rampling – duas lendas da Sétima Arte que se encarregaram de deixar a telona muito mais bonita. Deve ser por isso que a marca optou por abrir om desfile com Thairine Garcia, tão ruiva quanto a estrela de “Henrique VIII e suas seis esposas” (1972) e “Zardoz” (1974).

E as homenagens não param por aí: o legado fotográfico do mestre Helmut Newton e de Gosta Peterson e Watanabe Katsumi também é mote para a evolução de uma coleção que vai adiante no espírito boho que permeia a grife, caindo no japonismo. O belo colorido da fila final pode perfeitamente evocar as páginas de editoriais do período em que as duas estrelas eram figurinha certa em produções cinematográficas classudas e o trabalho dos outros três ilustrava as revistas de moda.

Influências orientais (que estava em voga na época) são convertidas à contemporaneidade, com destaque  para as estampas de leques, os quimonos, as laçadas e obis ajustando cinturas, além do colorido que mistura marrons e caramelos com uva e verde militar. Cascatas de babados nas mangas e pernas das calças funcionam bem, e os jacquards de seda valorizam a coleção.

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Outra marca carioca que atualmente usa São Paulo como plataforma de lançamentos, a Sacada resolver respingar tinta na passarela. Como assim? Bom, tendo com a pop art de Roy Litchtenstein como tema, a grife mostrou peças nessa pegada, abusando do pontilhismo das retículas gráficas como estampa e até como padronagem de corte a laser. Tudo em peças linha A, fofinhas, otimamente cortadas, fresquinhas e bem verão (além de uns tops com calça cropped), tendo como matérias primas piquê, tricô e ou couro levinho. Bonitinho, bem feito, comercial até, com boa sacada (ops, olha o trocadilho!) das referências que inspiraram a coleção.

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Com marrom, vermelho e branco ou azul e amarelinho e branco de novo, Juliana Jabour recria os anos 1970 com graça, mantendo aquela verve descolada de menina carioca que tanto lhe encanta. Olhando a boa coleção, a gente até imagina Fernanda Lima, que já desfilou pela grife e encarna essa mulher que inspira a estilista circulando pelo calçadão do Rio nessa vibe despretensiosa, mas muito legal. O ponto alto são os macacões e macaquinhos, peças que são caras à marca e que já fazem parte do seu repertório. Difícil pensar num desfile de Juliana que não tenha pelo menos um deles. Mas, dessa vez, ela se superou.

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Dessa vez, a Triya esqueceu de querer incrementar nos recortes estranhos que fazem o show na passarela, mas impossibilitam a mulher de pegar sol, sob o risco de acabar ficando com um patchwork de bronzeado na pele, enveredando agora por um sem número de estampas, quase todas uma graça! Deu certo a renovação e, assim como Paula Raia mais cedo, Isabela Frugiuele – dona e cabeça pensante da grife – acertou bonito, inclusive fazendo uma coleção rejuvenescida. Entre o canto da sereia e a surfista como inspiração, ela veio romântica, com frases como “o amor é a chave” impressas no release, dando a entender que está amando. Bom, pelo menos amando a coleção. Mas, considerando que os bombons Sonhos de Valsa são apoiadores do desfile (vinha um kit dentro da sacola de brindes), tudo indica que, para a marca, o sentimento está no ar.

Uma boniteza os vestidos cuja parte de cima começa como um long john para depois derivar num longo soltinho ou num macaquinho. Os produtores de moda que querem peças-conceito para seus editoriais de verão agradecem. E os bodies e maiôs com telinha feita com canutilhos dão a verve de a quantas anda afiado o processo criativo de Isabela. Além disso, os desenhos de hibiscos e ondas do mar, assim como os prints étnicos que lembram tatuagens tribais, vão agradar em cheio o mulherio mais jovem e descolado, que ama um rabisco na pele.

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