Homofobia! No esquenta dos Jogos de Inverno, o que têm em comum o paraíso tropical e a Rússia glacial?


Enquanto o mundo se mobiliza contra a violação dos direitos na terra do czares – tendo a Olimpíada de Inverno como vitrine -. no Brasil Feliciano quer ganhar seu milhão à custa de Cristo!

Os Jogos da XXII Olimpíada de Inverno, que acontecem na cidade-resort de Sóchi, na Rússia, só começam semana que vem, em 7 de fevereiro, mas já têm polêmica suficiente para hashtag dizer chega! Chega não, sigamos lutando! É o que pretendem ativistas do mundo todo. Não se trata apenas de banheiros comunitários de mau gosto, muito menos de notícias de possíveis atentados terroristas, mas de notórios casos de violações de direitos. A organização All Out anunciou, semana passada, uma série de ações a serem realizadas em apoio à comunidade LGBT, que estaria sendo desrespeitada na antiga terra de Catarina, A Grande. E manifestações globais, oriundas de artistas, atletas e ativistas, utilizam este evento de projeção internacional para pedir o fim das intoleráveis leis homofóbicas russas, que violam o Princípio 6 da Carta Olímpica que, por sua vez, proíbe qualquer tipo de discriminação. Discriminação que rege o legislativo, violando direitos e cometendo intransigências todos os dias neste país conhecido – entre marcos “perestroikos”, trotskistas, leninistas ou inseridos na economia de mercado – por machos pseudo-alfa bêbados e suas lindas e convictas amélias contemporâneas.

Naturalmente, existe muito mais em comum entre Rússia e Brasil do que supõe a vã filosofia de gente esperta como William Shakespeare, e o elo entre o terrível inverno russo e o calorento verão brasileiro vai além de o fato de ambos os países fazerem parte dos BRICS ou de seus povos serem conhecidos pela afetuosidade. Lamentavelmente, o conceito intrínseco de país liberal costuma ser este: pobre país frio, de mulheres lindas presas às botinas de bárbaros das estepes bêbados e machistas, da mesma forma que, aqui no paraíso brazuca, aquele do “tudo se pode”, também permanece a ideia, nos corações dos gringos que flanam por aqui à revelia das involuções sacramentadas, de que tudo caminha às mil maravilhas, com magníficas vênus seminuas, portando biquínis sumários na hora de entrar no caixa eletrônico do bancos. Até mesmo uma das sete maravilhas do mundo moderno está aqui, no Rio. Porém, assim como em uma Rússia regada a destilado barato, aqui também existe uma imensa marcha rumo ao retrocesso, liderada por dublês de políticos religiosos e religiosos políticos que, vez ou outra (cada vez mais frequente), aparecem indignados e indignando o povo, aquela gente que se manifesta, sem sucesso, nas redes e nas ruas.

Entre os arroubos do pastor, deputado federal e presidente da Comissão de Direitos Humanos e Minorias da CâmaraMarco Feliciano, sapateando sobre os direitos humanos em cadeia nacional, e da famigerada dupla Bob-Pai e Bob-Filho, ops, Bolsonaro e Bolsonarinho, destilando seus conceitos (em português lamentável) acerca dos homossexuais, a Alerj, há um ano aprovava a lei que instituía o “programa de resgate dos valores morais, sociais, éticos e espirituais”, proposta pela deputada estadual, ex-senhora Roberto Carlos e ex-atriz  Myrian Rios, prontamente sancionada pelo governador do Rio de Janeiro, Sérgio Cabral. Bom, será que essa lei, que resgata os valores morais, sociais, éticos e espirituais, serve também contra a corrupção? Ou a corrupção não atenta contra os valores morais, sociais, éticos e espirituais? Obviamente, as mulheres-fruta não deixaram por menos: “Se vieram com essa lei para cima de mim e condenando o meu trabalho, eu vou mandar a Myrian tomar (opa!) conta da vida dela. Não vou mudar minhas atitudes”, rebate Gracy Kelly, a mulher-maçã, disposta a descascar um abacaxi sobre a deputada.

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Sua ideia, de acordo com o texto do projeto, é propor uma “reflexão sobre a necessidade da revisão dos valores morais, sociais, éticos e espirituais” na sociedade. Algo tão subjetivo – apenas subliminar nas atitudes da atriz – que nem a assessoria do núcleo do governo Cabral soube explicar com clareza qual seria exatamente o teor da penetração dessa lei. Aliás, como o texto é confuso – e difuso! –, corre-se o risco de até a penetração acabar sendo proibida no Rio de Janeiro, mesmo quando for praticada em casa, toda certinha. Nesse caso, alguns daqueles equivocados turistas estrangeiros, que aterrissar nestas terras em busca do hediondo turismo sexual, vão precisar reprogramar o GPS para se divertir no país dos czares, em plena Olimpíada de Inverno. Mas, enquanto esse evento não chega, a Secretaria de Estado de Assistência Social e Direitos Humanos do Rio vai se virando como pode, tentando segurar o abacaxi de Myrian com ou sem a ajuda providencial das mulheres-fruta.

Entende-se aprovar lei como acatar ideia? Medo. Aprovar lei seria acabrunhar-se na maligna carolice de Rios? Medo. Assim como ela, o Rio não deixa de ter seu histórico de tentativas homofóbicas, sempre em confronto com uma talentosa e estonteante comunidade LGBT carioca, bem escudada pelo programa Rio Sem Homofobia, que benemérito, faz parte do mesmo governo Cabral. Alguém se lembra do projeto de lei (este, ao menos não aprovado), do (também) pastor e deputado estadual Édino Fonseca, intitulado Cura Gay? Se aprovado, ao menos serviria como complemento ao Bolsa Família, ou seja, qualquer heterossexual precisando de uma graninha-extra poderia dizer “não sou mais gay, estou curado!” e ganharia sorrateiramente uma verba de bonificação para gastar em camisinhas e site de pegação na surdina.

Também na semana passada, foi noticiado que Marco Feliciano, que já afirmou que não deve ser reeleito para a tal Comissão de Direitos Humanos e Minorias da Câmara, pediu R$ 1 milhão em indenização no processo que move contra a produtora “Porta dos Fundos”, pelo seu “Especial de Natal”, afirmando que o vídeo, publicado na internet no último 23 de dezembro, ataca os dogmas cristãos. O material contém piadas sobre passagens bíblicas que contam a história de Jesus, contabilizando mais de 4,5 milhões de visualizações.

Se Feliciano estivesse na Grã-Bretanha, ele processaria o Monty Python em sua busca pelo cálice sagrado? Ou, nos Estados Unidos, convocaria uma cruzada contra o cineasta judeu Mel Brooks por seu episódio bíblico em “A História do Mundo – Parte 1” (History of the Word: Part 1, 1981)? Entretanto, ao que parece, o Filho de Deus anda mais preocupado com o rumo que o mundo tem tomado – e com a intolerância de gente como o pastor, que se auto-denomina arauto dos seus ensinamentos – do que com questionamentos propostos através do humor, caso contrário, já teria organizado um dilúvio por aqui, bem mais potente que as águas de março. Ou, quem sabe, varrido Brasília ou Moscou do mapa, estilo Sodoma, já que a corrupção é reinante nestas duas cidades. Por enquanto, o Todo-Poderoso parece estar mesmo deixando o livre-arbítrio nas mãos dos homens, para decidir o que vai fazer com cada um deles no dia do Juízo Final, sejam eles humoristas despudorados, políticos hipócritas, governantes corruptos ou legisladores intolerantes, aqui ou na Rússia.

E, enquanto os eventos esportivos não chegam, (esportes de inverno na Rússia e a Copa do Mundo no Brasil), esses arremedos de machão, que mais lembram aquele personagem cômico de quadrinhos britânico Andy Capp (Zé do Boné, no Brasil) que qualquer outra coisa, têm a missão de deixar de lado a homofobia – e a manguaça (vodca lá, cachaça aqui) –  e se voltar para suas mulheres que, muitas vezes são sucesso de pageview na internet (aqui e lá), em sites de relacionamento ou em cursos expressos de sexo oral. Assim como os russos, os brasileiros precisam deixar de lado essas sombrias influências, forjadas por hordas munidas de hóstias preconceituosas.