Exclusiva com Zé Pedro! Canal da Véia, sociedade patrulhada e o calendário da moda no país: “Passou aquela fase da carnavalização”


Em papo-gargalhada com HT, Zé Pedro falou sobre seu lado DJ: “Eu sou uma prostituta do som. Acho importante é a pista estar cheia. Se eu for tocar para uma pista que não gosta da mesma música que eu, eu coloco ela para dançar. Gosto de tocar para quem gosta de música, de dança”

Um dia dividido em dois. Primeiro, caixa de banco em Copacabana, Zona Sul do Rio de Janeiro, e, depois, estudante de Direito em Niterói, do outro lado da ponte. O futuro de Zé Pedro estava traçado: gravata no pescoço e Vade Mecum na mão. Mas, na noite em que ele foi convidado para atacar de DJ na extinta boate Crepúsculo de Cubatão, o porão com estética dark mais badalado da urbe-maravilha na década de 80, tudo mudou. Zé Pedro foi com um terno todo estampado em flores e com uma peruca do sanfoneiro Sivuca. Dali em diante, ele nunca mais parou de seguir o conselho da amiga Marina Lima: não sair da luz. Fez trilhas sonoras para desfiles no eixo Londres-Milão, apresentou programas de TV, lançou discos que sumiram das gôndolas num passe de mágica e entrou, há cerca de dois meses, no mundo dos youtubers (profissionais que lucram com vídeos bem acabados esteticamente na plataforma) lançando o Canal da Véia.

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“Resolveram colocar a véia, que ficava em casa e era só DJ, para a rua e a transformaram em produto no Youtube”, explica, falando da véia – ele mesmo – na terceira pessoa. “Eu sou uma pequena empresa que deu certo”, gargalha. O terreno que está adubando, ele confirma, é fértil. “A internet é um planeta que você não pode imaginar. Eu quero fazer a conexão dos youtubers famosíssimos, que tem 5, 6, 7 milhões de acessos, com a moda”, explica. O bolso, por outro lado, é difícil de encher. “Não dá para ganhar dinheiro em lugar nenhum do Brasil ultimamente, né?”, brinca com a recessão econômica. Cifrões à parte, quem acessa o canal para assistir seus vídeos encontra a realidade de Zé Pedro, nas palavras do próprio: “Esquizofrenia de uma forma geral”.

Triste, HT nunca o viu. Mas agora, a graça está mais latente. “Essa história da persona do Zé Pedro virar produto é a maneira mais confortável de ganhar dinheiro. Porque, ali, sou eu. Não preciso pesquisar música, não preciso de mais nada. Só de colocar a única blusa que eu tenho (uma de gola preta da grife Lacoste que ele usa em todos os vídeos), o boné da véia, e ir”.  Enquanto os views do canal sobem, Zé continua tocando sua gravadora, a Joia Moderna. “Ela é o filho que eu não tive. Pago a matricula, o colégio, tudo em forma de disco”, compara debochado. Mas os números não escondem o sucesso. “Em quatro anos foram 32 discos, porque eu tenho mania de grandeza. Fizemos recentemente os 40 anos da Fafá de Belém e a ‘Rainha dos raios’ da Alice Caymmi também. A partir de janeiro de 2016 a gente volta a pensar na gravadora, porque agora, no final do ano, só Roberto Carlos e Paula Fernandes para lançar disco né?”.

O lado DJ, mesmo com o empreendedor falando mais alto, continua. Na última edição da São Paulo Fashion Week, por exemplo, Zé deu o tom de muitas trilhas sonoras. “Nós fizemos de tudo nesses 20 anos de semana de moda. Os meninos mais novos, que estão fazendo trilhas, sofrem com essa possibilidade da repetição. Vejo nos desfiles muita trilha que eu já fiz. Eles estão fazendo, porque, ou não conhecem o passado, ou não há mais o que inventar. É muito difícil”, analisa. Igualmente complicada é a situação da moda no país. A SPFW, para Zé Pedro, deixou de ser hype. E não que isso seja ruim. “O problema é que, no Brasil, tudo tem que virar moda para deixar de ser moda. Adoram pegar uma onda e depois jogar fora. Já passou aquela fase da carnavalização. As pessoas ficam achando que vai acabar, que moda já deu. A SPFW já passou por isso, graças a Deus. Só vem, atualmente, interessados em moda. Tem pouca gente que pousou aqui para fazer uma foto”, cutuca em entrevista nos corredores da Bienal. Em seus sonhos mais bonitos, o calendário da moda idealizado por Paulo Borges se torna algo tradicional, “como é no mundo todo”: “Espero que seja uma realidade para sempre”.

E já que é para pensar positivo: um mundo menos careta, por favor! “Meus amigos de 18 anos ficam jogando paciência no sábado. E eu, na mesma idade, já estava no Crepúsculo de Cubatão”, compara. Para Zé, o cenário da nossa atual sociedade patrulhada, com a ditadura sobre o que é dito, só tende a piorar. “Agora, que não temos a tal ditadura política, as pessoas são nossos ditadores. Toda vez que vou colocar o dedinho na tecla, eu penso 30 vezes antes de publicar. Às vezes quero debochar de algo e acho que serei mal entendido. Fico tenso na internet”, confessa. O motivo? “As pessoas estão com mais vontade de queimar, do que celebrar. E eu tenho um pouco de medo. Todos ficaram com direito de opinião muito próximo dos artistas. Elas sabem onde encontrá-los dia inteiro. Se elas querem derrubá-los, conseguem. Nos anos 80, por exemplo, você não tinha acesso a Maria Bethânia. Você sonhava em encontrar uma vez na vida”.

Conversa de quem, apesar de ter opinião para tudo, não lembra nem de seu próprio currículo. Coisas de Zé Pedro. “Um menino me encontrou agora e disse: ‘Ai, Zé. Adorava aquele seu primeiro disco. Era quase um caso de reencarnação, não parava de ouvir’. Gente, eu nem me lembro que disco é esse. Quando fui que eu fiz isso? Eu não sei nem onde estava em 1996. Sabe por que? Por que sou o agora. Adoro o agora”, filosofa.

Mas HT, baby, gosta de pensar lá na frente, no futuro. O que você ainda quer muito fazer? “Eu adoro uma frase que a Regina Casé me ensinou há muitos anos: ‘O que não existe está para ser criado’. Então, todo dia acordo com uma ideia. Deixo o escritório louco, crio uma ideia diferente. A gente vai!”. Papo vai, papo vem, a cabeça já está à mil só pensando em uma festinha. O setlist do DJ? “Eu sou uma prostituta do som. Acho importante é a pista estar cheia. Se eu for tocar para uma pista que não gosta da mesma música que eu, eu coloco ela para dançar. Gosto de tocar para quem gosta de música, de dança”, diz. Um desejo? “Que o iPhone deveria ser proibido na pista”. A gente apoia.