“Estamos exaltando a negritude, a resistência política, o papel da arte como instrumento de transformação e o valor da amizade”, garante Camila Pitanga sobre documentário em homenagem ao seu pai


Fazer o filme Pitanga foi uma jornada de autoconhecimento no qual a atriz teve a possibilidade de se conectar com sua ancestralidade. Além disso, contou sobre seu próximo projeto que envolve a história da Revolta dos Malês realizada em 1835

“Meu pai me mostrou a importância da dignidade e de resistir com amor, acreditando no melhor das pessoas. Também evidenciou a amizade no meio que fez com que ele fosse mais forte. Todo o ser humano no seu núcleo de amigos precisa descobrir o melhor do outro e ver o que podemos gerar para as pessoas na busca de formar uma grande rede, acho que o meu pai é o melhor exemplo disto”, exaltou Camila Pitanga sobre Antonio Pitanga, a verdadeira inspiração que gerou a homenagem em formato audiovisual no longa Pitanga. A atriz assinou, pela primeira vez, a direção de um filme ao lado do amigo Beto Brant que conta a trajetória de vida de seu pai. O documentário reuniu grandes nomes da música e televisão brasileira que passaram pela vida do ator como Caetano Veloso, Chico Buarque e Lea Garcia. A cinematografia brasileira é exaltada na produção que mostrará importantes diretores como Glauber Rocha, Cacá Diegues e Walter Lima Jr com os quais Antonio teve o privilégio de cruzar.

Apesar de Camila Pitanga possuir uma maior facilidade na hora de produzir o filme devido a intimidade com Antonio, a familiaridade poderia atrapalhar no momento de contar a história. “Por um lado precisei me distanciar um pouco do meu olhar de filha para pensar em como contar esta história. A parceria com o Beto Brant foi essencial neste sentido e, juntos, liberamos todo o nosso amor, até porque ele acabou se tornando um filho também. No entanto, me aproveitei da nossa intimidade para aprofundar ainda mais as questões e provocar os nossos convidados e ele mesmo. Foi muito bom poder rever a trajetória artística deles e acompanhar todas as conversas e encontros. Com este filme, estamos exaltando a negritude, a resistência política, o papel da arte como instrumento de transformação e o valor da amizade”, garantiu a atriz. Foi um trânsito entre utilizar o material humano afetivo que a atriz carrega na pele sem deixar de representar alguém que está guardando esta história brasileira na sua própria trajetória.

Antonio e Camila Pitanga desfilam pelo tapete vermelho do 45 Festival de Cinema de Gramado

Além de homenagear o pai que foi presenteado no Festival de Cinema de Gramado com o troféu Cidade de Gramado, a atriz também visualizava um viés histórico na produção já que seu pai foi político, militante e participou de grandes produções do audiovisual brasileiro. Antonio, por exemplo, fez o primeiro e último filme de Glauber Rocha, Barravento e A Idade Da Terra, respectivamente. “Muitas gerações não conhecem a trajetória do Cinema Novo e acho importante debater isto porque significa que estamos pensando na nossa identidade. Reconhecendo a luta dos negros que tem força, sucesso e vigor. Meu pai é um dos pilares que fazem parte das correntes desta época”, exaltou a filha.

Durante a pesquisa para fazer o longa-metragem, a atriz confessou ter também descoberto coisas sobre sua essência e história, afinal, ela seguiu a mesma trajetória de vida do mais velho e parte de suas influências artísticas vieram das conexões que cresceu fazendo ao lado do pai. “Tive uma conexão mais profunda com a minha ancestralidade, aprendi mais sobre meus hábitos e minhas raízes. São histórias que tem a ver com a minha negritude, mas também me faz entender o meu lado artístico. Entendi como funciona o meu estilo de interpretar e os caminhos e elos que o meu pai construiu ao longo da vida dele estão muito presentes na minha história, ainda que não seja visto de forma consciente”, explicou.

Camila Pitanga acabou se autodescobrindo ao fazer o filme sobre seu pai (Foto: Divulgação)

Com a passagem aplaudida de pé pela cidade de Gramado, pai e filha ganharam mais força para seguir investindo e trabalhando em projetos que ambos acreditam, afirmou Camila. “Depois de tanto reconhecimento e destaque, eu e meu pai estamos impulsionando o projeto Malês. É um filme de ficção que Manuela Dias está reescrevendo o roteiro feito há oito anos pela própria. Ela sentiu que precisava voltar com o texto devido ao amadurecimento que teve nos últimos anos. A questão desta história é importante para ela e pretendemos mostrar que resistência foi esta entre negros que tinham um vasto conhecimento. Meu pai vai dirigir este filme e estará eu, Lázaro Ramos, Taís Araujo, Seu Jorge, Jessica Ellen e muitos outros”, relembrou. A montagem está prevista para começar a ser produzida no ano que vem e irá contar a história da Revolta dos Malês que aconteceu na Bahia, em 1835, e foi realizada por cerca de mil e quinhentos escravos. Apesar de livres, os negros de ganho como alfaiates, pequenos comerciantes e artesões estavam sofrendo muita discriminação pela cor de pele e isto os impedia de ascender socialmente. Dessa forma, a pauta principal era a libertação da etnia.