Ao lado de amigos e familiares, o ator e escritor Pedro Neschling lançou o novo livro, ‘’Supernormal’’, na Livraria da Travessa, no Leblon


Inspirado inicialmente no longa-metragem Chasing Amy, de Kevin Smith, o livro retrata o reencontro entre Beto, um advogado careta, e seu melhor amigo da adolescência, Helena, que hoje é uma mulher transexual.

Depois de três anos desde o lançamento do primeiro romance, ‘’Gigantes’’, o ator e escritor Pedro Neschling  retornou às livrarias nesta quinta-feira, 24, com o seu mais novo livro, ‘’Supernormal’’. Antes de começar a sessão de autógrafos, que foi realizada na Livraria da Travessa, no Leblon, a expectativa do jovem, apesar do toque de ansiedade, era bem singela e típica de um amante da literatura. ‘’Eu convidei os amigos. O bacana de escrever o livro é exatamente isso, porque aparecem pessoas de todos os tempos da sua vida. Escrever é um trabalho muito solitário, então a expectativa de uma noite como essa é sempre de encontros e de escutar como as pessoas recebem o trabalho’’, conta Pedro.

E foi exatamente assim que o lançamento transcorreu. Em clima de alegria e de dever cumprido, o escritor, que estava acompanhado da esposa, Vitória Frate, e da mãe, Lucélia Santos, recebeu admiradores e grandes amigos, como os artistas Maria Flor, Sheron MenezzesFernanda Paes Leme, Armando Babaioff, entre outros, que não pouparam elogios ao trabalho de Pedro. ‘’Ele é de uma sensibilidade muito grande. Eu já tinha me encantado pelo outro livro dele, ‘’Gigantes’’, e estou curiosíssimo para ler esse livro. Eu sinto um orgulho tremendo de ter um amigo que da vazão à sua criatividade. Eu sou fã do Pedro antes de mais nada e fico muito feliz ao ver essa forma que ele encontrou de se expressar através da literatura’’, disse Armando, que conseguiu escapar das filmagens de ‘’O Segundo Sol’’ para prestigiar o amigo.

O livro, que inicialmente era um projeto cinematográfico, conta a história do reencontro entre Beto, um advogado comum, e Helena, que era seu melhor amigo na adolescência e hoje, 18 anos depois, é uma mulher transexual, causando um impacto no mundo e nos valores conservadores de Beto. ‘’A vida dele entra em parafuso, porque nada do que ele imaginava que era, o que ele foi ensinado que era normal, é o que ele encontra, então ele começa a descobrir que ele está aprisionado nos padrões que ensinaram pra ele e à medida que vai se libertando disso, obviamente paga o preço’’, conta o autor.

Pedro Neschling autografando o livro para a amiga e atriz Carolina Kasting. (Foto: Daniel Delmiro)

Apaixonado por assuntos ligados a relacionamentos humanos, Pedro sempre quis retratar a amizade em um projeto. ‘’Como autor, eu falo muito sobre pessoas reais, histórias cotidianas. Eu não sou um autor de gêneros, que faço histórias mirabolantes e invento o mundo, sabe? E a amizade é um tema recorrente, quase uma obsessão minha. Eu tinha muita vontade de falar sobre amigos que se reencontram depois de muito tempo, das complicações de relacionamentos amorosos ou sentimentais a partir desse reencontro’’, explica.

Embora não tenha vivido qualquer situação semelhante a do Beto, o momento de reencontro que Pedro tanto quis contar ultrapassou as páginas do livro. Durante a sessão de autógrafos, a grande amiga e atriz Fernanda Paes Leme teve a chance de rever o amigo que não encontrava há muito tempo. ‘’O Pedro é meu amigo há muitos anos, muitos mesmo, e fazia muito tempo que eu não via. Ele nem era tão grisalho assim na ultima vez que eu o encontrei’’, brinca a atriz que saiu do aeroporto e foi direto para a Livraria da Travessa.

Além de abordar um assunto tão querido na vida dele, o autor teve a oportunidade de trazer por meio dessa história um debate atual e extremamente necessário: a realidade transexual em uma sociedade intolerante e excludente. No entanto, apesar da personagem Helena ser uma co-protagonista ao lado de Beto, o autor fez questão de considerar o seu lugar de fala como um homem branco e hétero. Em ”Supernormal”, Pedro Neschling traz o assunto à tona por meio da visão do Beto ao entrar em contato com uma outra realidade. ‘’Eu não sou trans, então não faria sentido eu escrever do ponto de vista trans. Eu torço para que espaços sejam abertos e que autores transexuais possam eles mesmos falarem sobre a sua realidade. É fundamental que esse espaço exista’’, afirma.

Essa sensibilidade e consideração na escrita é a marca registrada do escritor e é, para muitos, o que o destaca no âmbito literário. Para se preparar para abordar um assunto tão delicado, Pedro passou por um longo processo de pesquisa com pessoas da comunidade trans, entre elas a travesti e doutora da Unicamp Amara Moira, que ficou responsável por assinar o prólogo de ”Supernormal’‘. Segundo ele, o contato com essa realidade foi essencial para a educação dele como cidadão. ‘’Eu fiz várias entrevistas com mulheres trans porque eu queria justamente fugir da imagem estereotipada, porque mesmo a gente sendo cabeça aberta, desconstruída, não sabe como é a realidade deles, a gente não tem essa vivência. Eu agradeço muito a essas pessoas que me nutriram para que eu pudesse fugir de armadilhas que eu pudesse cair sem perceber”, declara.

Assim como as entrevistadas, a esposa e artista plástica Vitoria Frate, que prestigiou o marido sem a filha Carolina, de 1 ano, esteve presente em todos as etapas do processo, apoiando-o e dando dicas para a história. Para ela, é uma sensação de dever cumprido poder ver o Pedro lançando mais um livro. ‘’É um processo muito difícil pra ele, muito solitário e eu fico ao lado, sempre vendo o sofrimento que é. Esse livro foi um processo muito longo, então é um momento de realização, eu sinto muito orgulho’’, conta.

Depois de duas horas autografando, Pedro Neschling terminou a noite com o seu desejo realizado: livros vendidos e muitos outros nas prateleiras para serem devorados. Para a mãe do escritor, a atriz Lucélia Santos, o lugar do Pedro sempre foi na livraria. ‘’Eu acho que o Pedro escreve muito bem. Não é porque eu sou mãe dele, tem o dom pra isso. Quando ele tinha dois meses, fizemos o mapa astral e lá dizia que ele teria muitas habilidades artísticas, mas que o fundamental seria a literatura. Ele já foi ator, diretor, mas eu realmente acho que é na literatura onde ele flui energeticamente.’’ Lucélia ainda completou: ’Eu acho esse livro realmente muito instigante, eu estou louca pra ler’’. Temos certeza que assim como ela todo mundo quer saber o que acontece entre Beto e Helena, né?